Autor : Coletivo

O STF não está em conflito com a Justiça do Trabalho: está em luta contra os direitos humanos

Por Rodrigo de Lacerda Carelli no JOTA

Se o STF não reverter sua jabuticaba, o Estado Brasileiro deve responsabilizado perante as cortes internacionais de direitos humanos pelos atos da Suprema Corte.

A imprensa noticiou recentemente suposto conflito entre o Supremo Tribunal Federal -STF e a Justiça do Trabalho. Falas agressivas do ministro Gilmar Mendes foram divulgadas, acusando as cortes trabalhistas de não respeitarem as escolhas políticas feitas pelo Congresso Nacional e pelo STF. A Justiça do Trabalho foi acusada pelo ministro de “sobrecarregar o STF” com reclamações constitucionais, “por caprichos da Justiça do Trabalho, que não devem obediência a nada: à Constituição, aos Poderes ou o próprio Poder Judiciário”. Se fica claro que o ministro resume o Poder Judiciário à Suprema Corte, não menos grave é ouvir notícia de que o Ministro Barroso busca uma solução para a questão, seja por meio de “pinçar um recurso extraordinário… para uniformizar a jurisprudência”, ou criando um Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas ou, o que é a solução mais insultuosa, encontrando uma forma de que o Conselho Nacional de Justiça faça com que os tribunais trabalhistas sigam as decisões do STF.


Deve ser deixado claro, logo de início, que quem criou o problema foi o próprio STF. O Tema 725 teve redação final muito mais ampla do que estava sendo discutido na Corte, que era os limites dados à terceirização, em especial a limitação do fenômeno em relação à atividade-fim. O texto do tema diz: “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”. A parte sublinhada não estava em discussão, não havia nada em relação a isso nos precedentes que deram origem ao tema. A partir daí, a Corte passou a, de forma surpreendente, decidir de forma monocrática Reclamações Correicionais em face dos órgãos de todas as instâncias da Justiça do Trabalho para muito além do texto vinculante, vindo a cassar decisões que reconheciam o vínculo empregatício pela utilização fraudulenta de uma ampla gama de contratos civis para mascarar o vínculo de emprego, desde falsos representantes comerciais autônomos a entregadores por plataforma, passando por médicos em hospitais e outros profissionais. As empresas descobriram o caminho de pular todas as instâncias trabalhistas e estão realizando uma enxurrada de reclamações ao Supremo Tribunal Federal. Esse é o primeiro ponto: o STF criou o problema pela extensão do tema, sem uma discussão profunda sobre as suas consequências, e por aceitar a via de reclamações correicionais como um super recurso, um super trunfo a ser sacado da manga para pular as cortes trabalhistas, para muito além do que está decidido no tema vinculante. Com a carta mágica da Reclamação não somente instâncias são puladas, mas se escapa de toda a análise fática dos casos. É mais que um recurso: é uma bênção quase divina, um zap do truco a ser lançado a qualquer momento do jogo para lhe pôr fim.


Mas não é só: ao contrário do que afirma o STF e repetem de forma apressada alguns analistas, a Justiça do Trabalho não está a descumprir o Tema 725 do STF. O argumento que move o STF, e que analistas fazem eco, é simples, em verdade simplório: a Justiça do Trabalho não está reconhecendo a validade dos contratos que o STF afirmou que são válidos. O argumento é tão simples quanto errado. A Justiça do Trabalho, nos processos em que reconhece o vínculo de emprego, constata a fraude em relação a um contrato civil. Para a existência de uma fraude há a necessidade do reconhecimento da existência legal de um contrato válido, mas que não se verifica no caso concreto analisado. Um golpe só é golpe porque aparenta a forma de um negócio jurídico válido, caso contrário ele é violência. Assim, a Justiça do Trabalho não nega a validade de nenhum contrato em tese, mas analisa o quadro fático e verifica se há os elementos do vínculo empregatício, como determina expressamente o art. 9º da Consolidação das Leis do Trabalho, no qual habita o princípio da primazia da realidade sobre a forma. Desta forma, a Justiça do Trabalho não despreza os contratos civis, mas sim reconhece que naquela relação específica, com base nos fatos trazidos aos autos, não há aquele contrato, e sim uma relação de emprego dissimulada. Aliás, isso é reconhecido até por algumas decisões do STF, como na Reclamação 56.285/SP e em outras. O comportamento contraditório, no caso, é todo do STF.


E é dessa forma (não a contradição, mas a verificação do contrato nos fatos) que ocorre no mundo inteiro, conforme se verifica no texto expresso da Recomendação nº 198 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que afirma no parágrafo 9º, que a existência da relação deve ser verificada em relação aos fatos, não importando como é caracterizada nos arranjos contratuais. No parágrafo 4º, a OIT conclama que os Estados devem “combater as relações de trabalho disfarçadas”, pelo “uso de acordos contratuais que escondam o verdadeiro status legal” e “que possuam o efeito de privar trabalhadores de sua devida proteção”. Um exemplo disso se deu na famosa decisão da Suprema Corte britânica no caso Uber, que aplicou expressamente o princípio da primazia da realidade. Afirmou a Suprema Corte do Reino Unido que “o ponto de partida deve ser sempre a linguagem da lei, não o rótulo usado pelas partes; simplesmente porque as partes usaram a linguagem do trabalho autônomo não significa que o contrato não é regido pela legislação trabalhista”. A mesma coisa ocorreu na França, na Holanda e na Espanha em casos famosos de trabalhadores em plataforma, todos ratificados pelas cortes superiores. Verifica-se, no caso, que se há uma jabuticaba entre as Cortes Superiores essa corte é o Supremo Tribunal Federal.


Nos Estados Unidos não é diferente: o governo Biden anunciou que a prioridade é o cumprimento da Recomendação nº 198 da OIT e o combate à fraude à relação de emprego. Aliás, há um estudo que demonstra que a pretensão de facilitar a contratação de trabalhadores como se fossem trabalhadores autônomos, como anunciada no Governo Trump nos Estados Unidos, custaria ao menos 3,7 bilhões de dólares aos trabalhadores e mais de 750 milhões de dólares de contribuições sociais não recolhidas.
Essas decisões do Supremo Tribunal Federal, além de inéditas no mundo, não são somente um perigo para a existência da Justiça do Trabalho e do direito do trabalho, mas são extremamente ameaçadoras para o cumprimento dos direitos fundamentais e dos direitos humanos. Como afirmou o Ministro Barroso em seu discurso de posse como Presidente do STF, os direitos fundamentais são “os direitos humanos incorporados à ordem jurídica interna” Segundo ele, “direitos fundamentais são a reserva mínima de justiça de uma sociedade, em termos de liberdade, igualdade e acesso aos bens materiais e espirituais básicos para uma vida digna”. O afastamento da relação de emprego pela mera existência de um contrato escrito tem em si a potência de destruir toda a proteção trabalhista no País. Não há a possiblidade fática do vínculo empregatício ser facultativo e a relação de emprego continuar existindo.

Todo empresário, como ser racional, vai maximizar seu lucro e, consequentemente, vai impor aos trabalhadores, como condição para serem contratados (ou permanecerem com seu emprego) a assinatura de contratos civis. Aqui sim, nem mesmo os empresários que desejam cumprir a legislação trabalhista o poderão, porque vão ter como concorrentes outros empresários que realizarão contratações mais baratas. Não é assim só no Brasil, é assim no mundo. E nenhum trabalhador poderá recusar a imposição empresarial, sob pena de não ter emprego. O caso da “opção” do FGTS está aí na história para quem quiser ver.


Assim, tudo cai como em um castelo de cartas. Não somente os direitos trabalhistas infraconstitucionais são exterminados, mas também os direitos fundamentais previstos no art. 7º da Constituição, que ficarão lá como enfeite, bem como toda a proteção à liberdade sindical, que será transformada em representação de ninguém ou quase ninguém. O trabalho em condições análogas de escravo grassará e explodirá, e ninguém será responsabilizado. Isso aqui não é uma suposição, pois recentemente em determinado julgamento de ação civil pública que denunciava condições análogas à de escravo no Tribunal do Trabalho do Rio de Janeiro a alegação da empresa foi justamente que eram contratos civis e que a Justiça do Trabalho era incompetente. Caso vigorasse nessa turma do TRT a tendência externada em algumas reclamações constitucionais, os trabalhadores, transformados magicamente em empreendedores, teriam continuado a dormir em papelões no chão e ingerir sobras de comidas. A arrecadação da seguridade social vai despencar, e o FGTS, responsável por financiar o saneamento básico e as moradias populares, simplesmente deixaria de existir. Talvez os ministros do STF, que alguns se dizem consequencialistas, ainda não se atentaram às consequências das suas decisões.


Mas não é só os direitos fundamentais positivados em nossa Constituição que estão em jogo. Há vários pactos internacionais de direitos humanos firmados pelo Brasil que ficariam descumpridos. A Convenção Americana de Direitos Humanos, pelo seu protocolo adicional de San Salvador, estende uma série de direitos previstos em nossa Constituição a todos os trabalhadores, entre eles limitação da jornada, repouso, férias, estabilidade no emprego, direito à promoção, salário equitativo, entre outros. O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais também traz um rol bem extenso de direitos trabalhistas a todas as pessoas. A Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 também traz o seu próprio rol de direitos basilares a uma pessoa humana. O Supremo Tribunal Federal poderia até tentar resolver o impasse que criou com a Justiça do Trabalho em uma interpretação evolutiva do art. 7º, que fala que os destinatários são os trabalhadores, em sentido amplo, como está também nos pactos, mas aparentemente esse não é o projeto do Supremo Tribunal Federal.


Assim, o processo de esvaziamento dos direitos fundamentais e dos direitos humanos realizado pelo Supremo Tribunal Federal atual tem que ser apontado. A tentativa de retirar da Justiça do Trabalho sua competência constitucional de acordo com os parâmetros mundiais é, ao fim e ao cabo, trágico não somente para a existência do ramo, mas para a proteção dos direitos humanos. A Justiça do Trabalho terá seu fim, pois não sobrarão mais jurisdicionados. O direito do trabalho será uma peça de museu, e a Constituição conterá um capítulo de direitos fundamentais abandonado, em ruínas, transformado em letras perdidas esvaziadas de qualquer valor normativo justamente por ato da Corte que teria o papel de realizar sua proteção. Pouco importa se isso ocorre por ideologia ou por ignorância do funcionamento do direito do trabalho e da Justiça do Trabalho, o fato é que este é o caminho que está sendo trilhado.


Somente o STF pode resolver essa crise. A Justiça do Trabalho não pode recuar, pois ela estaria se suicidando ao descumprir sua missão constitucional. Caso não seja revertida a posição da Suprema Corte, única no mundo, uma verdadeira jabuticaba, o caso deve ser levado às cortes internacionais de direitos humanos para que o Estado Brasileiro seja responsabilizado pela política realizada pela Suprema Corte. O Supremo Tribunal Federal não detém a última palavra em direitos humanos, não podendo passar por cima deles como está fazendo.

Rodrigo de Lacerda Carelli é Procurador do Trabalho na PRT/1, Professor da UFRJ e membro do Coletivo Transforma MP.

A revolução retrógrada da Era Barroso: um avanço contra os Direitos Humanos no trabalho

Fellipe Sampaio – SCO STF

Por Rodrigo Carelli no GGN

A atual composição do Supremo Tribunal Federal – STF vem sendo comparada à Era Lochner, que, a partir do fim do século XIX e início do século XX, foi o período mais conservador da Suprema Corte estadunidense, caracterizada pelo ativismo judicial para desconstruir os direitos sociais democraticamente construídos. O período atual realmente guarda muitas coincidências com aquela composição da corte máxima do grande país do Norte, mas neste início de texto deve ser justificada a razão pela qual devemos chamar a presente fase de Era Barroso. Essa proposta não afirma que Barroso está sozinho na linha de retorno ao século XIX, afinal não se faz uma corte com um julgador só. Claramente há outros, alguns mais ruidosos e menos elegantes, outros mais silenciosos, mas não menos atuantes. A proposta se deve ao fato de que Barroso se apresenta como o líder intelectual e porta-voz das atuais mudanças propostas, progressistas nos costumes, e retrógradas em relação aos direitos sociais. Barroso apresenta suas propostas não somente em seus votos e nos debates na corte, mas também em palestras ao redor do mundo desenvolvido, na forma de “uma agenda para o Brasil”.

A Era Barroso não se inicia com a sua chegada à presidência (do STF, não da República), mas está em movimento desde meados da década passada, com a autopromoção do STF à condição de protagonista do processo chamado de “Reforma Trabalhista”, precedendo nos pilares centrais às mudanças legislativas ocorridas em 2017, defendendo essas alterações mesmo com suas patentes contradições ao texto constitucional e aprofundando-a de forma agressiva.

A chegada à presidência do Ministro Barroso parece ser o clímax desse movimento de forte ativismo judicial retrógrado. De fato, apesar de ser um tanto assustador, o presidente do STF recém-empossado foi a Paris participar de um fórum, patrocinado por think tank da elite econômica brasileira, para conversar com empresários brasileiros com o objetivo de “vir ao espaço público e explicar o que está acontecendo no Supremo Tribunal Federal.” Barroso inicia sua fala justificando sua presença no evento para que o Supremo possa “se comunicar com a sociedade”.  A razão dessa comunicação com a sociedade brasileira ser feita em Paris, e não em qualquer cidade pátria, e o público ser somente composto de empresários brasileiros, pode ser encontrada nas estratégias que geraram a própria Análise Econômica do Direito, à qual o ministro parece seguir. Essa prestação de contas, nos dizeres do Presidente Barroso, é muito elucidativa para o que está por vir em sua gestão na Suprema Cote do Brasil.

O Ministro Barroso inicia sua fala afirmando que o protagonismo do STF se dá pela natureza da nossa Constituição, que é abrangente, e trata de vários sistemas em seu bojo, ao contrário de outros diplomas. Interessante que o Presidente da Suprema Corte cita nove grandes temas tratados sistematicamente na Constituição, mas não fala do sistema constitucional de proteção ao trabalho. Em seguida, afirma que o STF é uma instituição que apoia o empreendedorismo e a valorização da livre iniciativa, mas de forma curiosa se esqueceu que nas duas únicas vezes que a Constituição, aquela escrita e promulgada, cita a livre iniciativa fez por bem preceder a ela os valores sociais do trabalho e a valorização do trabalho humano.

Mas não é que Barroso se esqueceu da questão do trabalho, muito pelo contrário. Para justificar a atitude pró-empreendedorismo da Suprema Corte, listou uma série de atitudes do tribunal: afirmou que o STF garantiu a prevalência do negociado sobre o legislado “muito antes da reforma trabalhista”, validou a reforma, “inclusive em relação à contribuição sindical obrigatória”, “validou a terceirização em atividades econômicas fins e derrubou as leis que proibiam o transporte individual por aplicativo”. Como o fim da contribuição sindical obrigatória pode ter a ver com a valorização da livre iniciativa, isso somente o ministro pode dizer, mas a prestação de contas foi feita. O que ele deixa a perceber é que o que entende por defesa do empreendedorismo é a retirada de direitos trabalhistas.

Em seguida, o ministro volta a falar de trabalho, novamente com o tom negativo e sem qualquer correlação com o texto constitucional. A primeira área que cita ao falar de insegurança jurídica é a área trabalhista. Afirmou que o custo de uma relação trabalhista só se sabe ao final e que há 5 milhões de processos trabalhistas, oriundos de alguns empresários que se comportam mal, a existência de uma “indústria de reclamações trabalhistas” e a legislação, que é “de uma tal complexidade que mesmo quem queira cumpri-la não consegue cumprir adequadamente.”

O Ministro ainda se mostra incomodado com o número de ações trabalhistas. Deve ser lembrado que em evento mais uma vez ocorrido na Europa, desta feita em Londres, Barroso chegou a afirmar o dado falso que o Brasil detinha 98 por cento das ações trabalhistas de todo o mundo. Em Paris, 5 anos depois, Barroso se agarrou a um dado correto, mas sem colocá-lo em perspectiva. Barroso não falou que temos mais de 6,4 milhões de casos criminais em andamento, muito menos se mostrou preocupação quanto a isso. Não falou também dos 10 milhões de casos da Justiça Federal, que tem a União em sentido amplo como parte, que gera, portanto,  o dobro de casos em comparação com todos os empregadores do Brasil. O Ministro Presidente, da mesma forma, não citou que o assunto mais demandado não só na Justiça do Trabalho, mas em todo o sistema judiciário, como aponta o Anuário da Justiça 2023 do Conselho Nacional de Justiça, é a rescisão do contrato de trabalho. Ou seja, a causa mais frequente de ajuizamento de ações no país é justamente a dispensa de trabalhador sem pagamento de verbas rescisórias.

Nos círculos empresariais, nos jantares europeus pós-eventos, o Ministro deve ouvir a máxima de senso comum que corre nesse meio de que “o empresário somente fica sabendo o custo do trabalho quando termina a relação”, que é desprovida de qualquer sentido de realidade no dia a dia das relações de trabalho, em que empresas têm na ponta do lápis todos os custos e riscos de descumprimento da legislação. O que ocorre é justamente o inverso: vários processos terminam na Justiça do Trabalho com valores muito menores do que são devidos aos trabalhadores, pois o trabalhador tem fome, e verbas rescisórias são verbas alimentícias, e qualquer valor ofertado pode ser irrecusável. Se o Ministro fosse buscar na empiria, e não em discursos ideológicos, veria que existe mesmo uma indústria: uma indústria de descumprimento de direitos básicos, previstos em sua maioria na Constituição como direitos fundamentais.

Se o Ministro quiser mesmo entender as razões do número de ações trabalhistas, deve buscar nos números, ir aos dados e analisá-los, e não se basear mais uma vez no senso comum. Em 2022 foram 20.610.413 de dispensas no Brasil contra 3.179.259 ações trabalhistas ajuizadas. Ou seja, bem menos do que 15% dos trabalhadores formais dispensados ajuizaram reclamações na Justiça do Trabalho, pois temos que somar às dispensas dos trabalhadores formais todos os trabalhadores sem carteira assinada do país e os falsos autônomos, buscando o reconhecimento do vínculo de emprego. No Brasil, tomando 2022 como base, se compararmos os trabalhadores empregados sem carteira e com carteira assinada, sem contar as fraudes, temos 33 por cento de trabalhadores sem CTPS anotada. Ou seja, se ocorresse a mesma proporção de dispensas, teríamos mais 6.866.804 de trabalhadores dispensados, o que redundaria em que somente 11 por cento dos trabalhadores mandados embora ajuizaram ações. Dado o tamanho do descumprimento da legislação no país, o número de ações trabalhistas no Brasil deveria ser muito maior do que é, não o sendo por diversos fatores que não temos aqui tempo de listar. 

O Ministro Barroso, ao falar da complexidade da legislação trabalhista, aliás recém reformada em mais de 100 dispositivos, a qual inclusive o Ministro usou como defesa perante os empresários, como sinal de valorização do empreendedorismo pelo STF, deveria ter tratado do estranho fenômeno das empresas sem ações trabalhistas, ou com níveis baixíssimos de judicialização das relações. Com a frase de senso comum empresarial apresentada pelo ministro seria difícil explicar o fato de que o maior litigante na Justiça do Trabalho, o Banco Santander, com 52 mil empregados e 58 mil trabalhadores, contando terceirizados, concentra 0,42% de todas as ações trabalhistas do Brasil, tendo apenas 0,0013% dos empregados no país.

Talvez estudando esse fenômeno poderia perceber que também se trata de uma lenda urbana a afirmação da impossibilidade de cumprir a lei, afirmação gravíssima para quem ocupa o mais alto posto do Judiciário, podendo ser entendido pelos cidadãos que realmente não precisa cumprir a lei, dado que, conforme garantiu o Presidente do STF, trata-se de desafio impossível, portanto completamente escusável.

Mas o discurso do Ministro Barroso fica extremamente contraditório quando apresenta uma “lista pessoal” do que nomeia de “uma agenda para o Brasil”. Apesar de afirmar que os itens apontados estão na Constituição, a seleção e escolha são evidentemente do ministro. Inicialmente, afirma que o grande problema do Brasil seria a pobreza e a desigualdade, citando dados alarmantes. Entretanto, como acabar com esses problemas destruindo o direito do trabalho, exímio redutor de desigualdades, o Ministro não explica. Afirma o Presidente do STF que sem crescer não haverá o que distribuir, lembrando muito o mote econômico da ditadura na época do AI-5: “fazer o bolo crescer, para depois dividi-lo”; o bolo cresceu, mas a divisão dele nunca aconteceu nas classes mais baixas, que tiveram salários reduzidos e decréscimo na participação da renda nacional.

Essa “agenda para o Brasil” tinha sido lançada no seu discurso de posse na presidência do STF.  A lista da agenda na posse é ligeiramente diferente da apresentada aos empresários, pois junto com a valorização da livre iniciativa o ministro colocou a expressão “do trabalho formal”. Apesar de ausente na fala de Paris, os “direitos humanos” aparecem cinco vezes em Brasília. “Direitos Fundamentais”, conceituados no discurso na capital federal como “os direitos humanos incorporados à ordem jurídica interna”, aparecem seis vezes. Segundo o Presidente, os “direitos fundamentais são a reserva mínima de justiça de uma sociedade, em termos de liberdade, igualdade e acesso aos bens materiais e espirituais básicos para uma vida digna”. Não há como não concordar com o ministro neste ponto.

Não há como concordar com o ministro, no entanto, na ausência do direito do trabalho em ambos os discursos. Não dá para concordar também com a colocação da valorização da iniciativa privada na frente do trabalho, pois essa não é a ordem constitucional, nem no art. 1º, nem no art. 170, que colocam a valorização do trabalho na frente da iniciativa privada.

O Direito do Trabalho está na Constituição no Capítulo II do Título II, denominado de “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”. Ou seja, segundo o próprio conceito do Ministro, os direitos trabalhistas ali listados são os direitos humanos positivados e que incorporam a reserva mínima de justiça na sociedade, em termos de liberdade, igualdade e acesso aos bens materiais e espirituais básicos para uma vida digna. Assim, a exclusão de trabalhadores da proteção constitucional dos direitos fundamentais é algo gravíssimo, pois impede o acesso a essa reserva mínima de justiça.

O que estamos vivenciando é uma revolução que é apresentada com ares de modernidade, de luz e de progresso, mas que não consegue esconder seu caráter eminentemente retrógrado. É  uma revolução comandada pelo STF, que propõe em sua agenda um retrocesso da proteção social à virada do século XIX para o século XX. O avanço que faz o STF sobre a relação de emprego, na pretensão de que as fórmulas contratuais civis prevaleçam sobre os fatos reveladores de uma relação de emprego, é o maior ataque aos direitos sociais já visto no Brasil. Ele tem a possibilidade real de esvaziar de conteúdo toda a proteção trabalhista presente na Constituição e nas leis infraconstitucionais, além dos tratados internacionais firmados pelo Brasil durante o século XX. Torna letra morta todas as normas de combate ao trabalho escravo contemporâneo, a proteção ao meio ambiente laboral, a discriminação no trabalho, a proteção à gestante e à criança e adolescente. Permite a exclusão da proteção por um mero papel assinado, ou mesmo um “Li, aceito e concordo com os termos de uso” em um aplicativo qualquer, submetendo o trabalhador à autoridade inapelável do algoritmo.

O Ministro Barroso citou algumas vezes o Admirável Mundo Novo em seu discurso em Paris, com um tom de maravilha pelo avanço tecnológico digital. Parece que o Presidente do STF não leu a obra de Aldous Huxley, que mostra um mundo distópico no qual as pessoas são divididas em castas controladas e incentivadas a se conformar com regras autoritárias. Nesse mundo, um dos deuses é justamente Henry Ford como representação da tecnologia. O mundo tecnológico de hoje não pode ser de forma alguma um retrógrado admirável mundo novo, mas sim um mundo justo, solidário e igualitário como descrito na Constituição de 1988.

O artigo não manifesta necessariamente a opinião do Coletivo Transforma MP.

Rodrigo de Lacerda Carelli é Procurador do Trabalho na PRT/1, Professor da UFRJ e membro do Coletivo Transforma MP.

Sem câmera, sem ação!

Cristina Ferreira Labarrère Nascimento (MPMG) e Mário Henrique Cardoso Caixeta (MPGO) no GGN

Diz a lei que a adulteração de local de crime e o ato de constranger profissional de saúde a atender pessoa morta configura delito

Uma lesão produzida por projétil de arma de fogo calibre 9mm na região temporal muito dificilmente será compatível com a vida. Qualquer dúvida é dissipada pela fotografia da cratera aberta na cabeça do baleado, com miolos escorrendo como lava de vulcão. Mesmo assim, a pretexto de socorrer a vítima desse quadro irreversível, o atendimento médico de urgência foi acionado, compareceu ao local e recolheu o baleado, levando o corpo já sem vida à unidade de saúde.

Essa mesmíssima história se repete com frequência. Essencialmente, o que se tem é a adulteração do palco de eventos que resultaram na morte, de uma ou várias pessoas, por agentes do estado.

De um dos laudos de perícia de local de crime realizada após a completa alteração do cenário dos fatos colhemos um relato interessante. Dizia o laudo mais ou menos assim: o histórico da ocorrência relatava a presença de oito vítimas fatais, de arma e diversos elementos de munição. As vítimas foram removidas e as armas descritas não se encontraram no local. Ainda no ambiente periciado foi constatada alteração na disposição dos objetos.

Com uma passada de olhos nos laudos cadavéricos vimos corpos com lesões provocadas por projétil de arma de fogo que atingiram a região inferoposterior da cabeça, ou nuca, e com orifício de saída na região anterior correspondente. Qualquer profissional das áreas de segurança pública, do Ministério Público ou do Poder Judiciário, ainda que não muito afeito à medicina legal, poderá intuir, a depender da natureza da lesão, que a morte foi instantânea e que é preciso coibir o expediente de alterar o cenário dos fatos com a justificativa de prestar atendimento médico a quem já morreu.

Diz a lei que a adulteração de local de crime e o ato de constranger profissional de saúde a atender pessoa morta configura delito (artigos 23 e 24 da Lei 13.869/2019, denominada Lei de Abuso Autoridade). Na prática, no entanto, a efetividade da norma é duvidosa, porque demanda de quem sofreu o abuso de autoridade ou constrangimento que se insurja contra aqueles que o praticaram, sem qualquer garantia de proteção. Profissionais de saúde que lidam rotineiramente com forças de segurança pública não hão de atrair para si esse tipo de indisposição. Menos ainda os que são investigados ou réus na persecução penal.

Os agentes do estado que assim agem, por outro lado, se de uma primeira análise parecem algozes, por meio de um olhar mais atento exsurgem indubitavelmente também como vítimas: vítimas de uma política de segurança pública perversa, baseada no confronto, que pouco se importa com aqueles que vão se digladiar, ocupem eles qualquer lado do conflito. A meta e os valores que essa guerra protege estão muito distantes desses campos de batalha.

O agente de segurança de baixa patente, aquele que atua na rua, ali foi lançado como um soldado numa guerra que ele não deflagrou, mas para a qual foi recrutado e pela qual se espera que ponha em risco a própria vida diuturnamente. Assim, quando altera o cenário dos fatos, o faz na plena convicção de que atua em nome de um objetivo maior, traçado por cúpulas muito acima de sua esfera de autonomia e o faz também nesse contexto de extrema pressão, baixa remuneração e saúde mental comprometida.

Sob um flit paralisante qualquer (indiferença é o nome do veneno) a família tradicional brasileira assiste a esse quadro de barbárie: escalada das mortes por intervenção policial. O lamento esboçado pela morte de agentes de segurança pública e civis em operações é pontual e oco, nunca força motriz para que essa família tradicional se insurja contra a forma de se estruturar a política de segurança pública. Os agentes do estado engendrados nesse sistema tampouco percebem que estão enredados em uma guerra de servidores públicos invisíveis e mal remunerados contra pobres, instrumentos do tráfico ou da milícia. Que fique claro, o Estado logo cuidará de substitui-los, e a dor será exclusiva de parentes que perderam aqueles que, no dizer do poeta Belchior na música Alucinação, estavam lá cumprindo o seu duro dever e defendendo o seu amor e nossa vida.

Ocorre que quem tem o privilégio de não vivenciar esses confrontos de maneira mais direta e deles só toma conhecimento por meio de noticiários tem incutida a concepção de que, sim, há barbárie, mas ela seria em prol de um bem maior: o combate à criminalidade. Há muitos que estão dispostos a lidar com essa carnificina como casualidade de uma guerra que precisa ser travada. Ignoram – seja por comodismo e falta de interesse em se aprofundar no assunto, seja porque os veículos de comunicação pouco fazem para aclarar o tema – que, na prática, um incremento no punitivismo e na letalidade policial não redundam – e nunca redundaram – em uma sociedade mais segura. Pelo contrário, é intensificado o estado de conflagração.

Assim, o que o balaço 9mm que inaugurou essas linhas tem a ver com as recorrentes notícias das guerras conflagradas na Bahia[1], no Guarujá[2], em Goiás[3], e em todo canto desse Brasil? Tudo a ver!

Sem descurar que esse tenebroso cenário é multifatorial e que não há BALA DE PRATA para solucioná-lo, nosso estado de coisas, tanto sob aspecto constitucional (vivemos em um estado inconstitucional de coisas[4]), como também sob perspectiva tecnológica, exige uma pronta e efetiva ação, capaz de, ao menos, diminuir esse número de “cancelamentos de CPFs”, para usar o termo preferido por aqueles que enaltecem a violência policial e que têm fixação na morte violenta de pessoas, em regra, pretas e pobres, por agentes do estado – pouco se importando, também, com a morte desses mesmos agentes. Essa ação consiste na exigência de implementação imediata de câmeras no fardamento dos policiais, as denominadas CÂMERAS OPERACIONAIS PORTATEIS (COPs).

Essa necessidade imperiosa foi declarada por mais de uma vez pelo Superior Tribunal de Justiça. No HC 598.051-SP o Ministro Rogério Schietti Cruz registrou, citando notícia veiculada pelo Estado de Santa Catarina, que “o uso da câmera aumenta a transparência e a fiscalização das ações policiais; ajuda a conter a reação das pessoas abordadas, pela percepção de que estão sendo filmadas, e, consequentemente, reduz a necessidade de uso da força por parte dos policiais.” Além disso, “a transparência e a ética nas ações são fundamentais, tanto para os agentes públicos quanto para os cidadãos. A câmera individual deve regular essa relação com mais eficiência, resguardando vítimas e evidenciando possíveis casos de má conduta, isso de ambos os lados”, ressaltou o governador do estado (Disponível em: https://www.sc.gov.br/index.php/noticias/temas/segurancapublica/cameras-individuais-passam-a-integrar-servico-da-policia-militar-desanta-catarina. Acesso em: 1º set. 2020)”[5].

Os argumentos contrários a essa medida, dentre eles o de que o uso de COPs resultariam em inibição do agir policial, caem por terra quando examinados os dados obtidos a partir dessa inovação. Em verdade, só é contrário à utilização das COPs aquele que, ao fim e a cabo, crê que direitos fundamentais e obediência aos ditames legais representam entraves à atuação policial, e não seu norte.

Quanto à redução da letalidade policial, destaca Daniel Edler, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, que “segundo relatório realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o projeto foi responsável pela redução, entre 2021 e 2022, de 63,7% da letalidade policial geral, sendo 33,3% da letalidade nos batalhões que não aderiram ao sistema e 76,2% da letalidade nos batalhões que passaram a utilizar as câmeras”[6], o que é confirmado por notícias dos mais variados veículos de comunicação[7].

Ora, denunciados os alarmantes números de mortes por intervenção policial e também o número significativo de agentes de segurança mortos em razão das funções; presentes dados confiáveis que indicam que as câmeras inibem abusos de ambos os lados do conflito; e atestada a eficácia do uso de CÂMERAS OPERACIONAIS PORTÁTEIS na diminuição desses números, o que justifica não as implementar?

Para além desses números, que apontam para a necessidade de uso das COPs, há outros vieses que merecem realce, os quais, parece-nos, passam despercebidos em instâncias de poder que tratam do assunto. O primeiro se refere à maior efetividade do agir policial, quando documentado em imagens das COPs. Com efeito, já está sedimentado na jurisprudência dos Tribunais Superiores que não basta a palavra do policial para garantir a validade da prova no processo criminal (que é uma das últimas fases na execução de uma política de segurança). Assim, se as imagens demonstram escorreito respeito aos direitos fundamentais da pessoa abordada pelo agente estatal, logo, a prova obtida dessa abordagem gozará de maior credibilidade. O segundo se refere à proteção do próprio agente estatal, à medida em que as COPs evitarão acusações infundadas de abuso policial, havendo imagens que digam em sentido contrário. Por fim, nos casos de morte por intervenção policial, como os dois que inauguraram este texto, as imagens poderão dizer que, apesar das graves lesões, a ação dos agentes do estado foi legítima! Não é infalível, é claro, esse mecanismo, todavia, ele está à disposição e pode, e muito, contribuir para melhorar esse belo quadro social, para nos valermos da fina ironia de Raul Seixas.

Apesar disso, nos surpreendem decisões como essa, da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que votou contrariamente a projeto de lei que previa a implantação das COPs[8]. Cabe aqui, novamente, a pergunta: O que justifica não implementar as COPs?

Quando se vê o estado brasileiro investindo maciçamente em “Caveirões” para conter massacres, a justificativa não pode ser financeira ou orçamentária para não implementar as COPs![9]. Logo, a não implementação é uma opção política, uma estratégia para não mudar esse estado de coisas inconstitucional. Se esse estado de coisas é responsável pelo extermínio estruturado de pessoas, cumpre exigir, como condição de validade do agir policial, a instalação de COPs, sob pena de declaração de nulidade absoluta da prova decorrente da atuação estatal. Claro, como já dito, as câmeras não são a solução pronta e acabada desse quadro. A elas devem se somar outras ações, de cunho estruturante, como o investimento maciço em prevenção; na educação e informação responsável da população em geral acerca de políticas de segurança pública, com transparência e esclarecimento de que uma Polícia mais letal não resulta numa sociedade mais segura; na formação eficaz dos agentes estatais em práticas assecuratórias de direitos humanos; no cuidado aos agentes estatais, principalmente sob perspectiva da saúde mental, etc. Mas, enquanto nada disso é feito e como temos à mão uma medida com alguma eficácia, brademos: Sem câmera, sem ação!

O artigo não manifesta necessariamente a opinião do Coletivo Transforma MP

Cristina Ferreira Labarrère Nascimento – Membra do Coletivo Transforma Ministério Público desde 2023, Membra Fundadora do Coletivo Repensando a Guerra às Drogas. Promotora de Justiça no Ministério Público do Estado de Minas Gerais desde 2011. Bacharel em Direito pela UFMG – 2008. Bacharel em Jornalismo pela PUC Minas – 2004.

Mário Henrique Cardoso Caixeta – Membro do Coletivo Transforma MP desde 2022. Membro do Coletivo Repensando a Guerra às Drogas. Especialista em Direito Processual Civil: O Novo CPC em Perspectiva e as Tutelas Coletivas como Instrumentos de Defesa da Cidadania – Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul (2018). Especialista em Criminologia e Política Criminal pela Anhanguera-Uniderp (2015). Mestre em História pela PUC – Goiás na linha de pesquisa Cultura e Poder (2009).  Promotor de justiça no Ministério Público do Estado de Goiás desde agosto de 2000. Bacharel em Direito pela UFU – 2000

Empresas e direitos das pessoas LGBTQIA+

Por Lucas Dias no Jota

O caso Olivera Fuentes versus Peru e as intersecções no Brasil

Em 2023, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) proferiu importante decisão que guia os Estados e as empresas na proteção dos direitos LGBTQIA+ e determina que se avance nesse tema, que ainda sofre (e morre!) pelo ódio e pela intolerância.

No Caso Olivera Fuentes vs. Peru, foi analisada a homofobia ocorrida em 2004, quando um casal gay foi retirado de uma cafeteria no Peru, porque “cometiam atos de homossexualidade” e a conduta feria “a moral e os bons costumes” coletivos.

A Corte IDH entendeu que o ato discriminatório inicial foi praticado por uma empresa (ou seja, um agente não estatal), pelo que o Tribunal foi chamado a determinar se existia responsabilidade internacional do Estado em relação às respostas administrativas e judiciais concedidas pelas autoridades em relação à denúncia apresentada.

O Tribunal indicou que existe uma ligação indissolúvel entre a obrigação de respeitar e garantir os direitos humanos e o princípio da igualdade e da não discriminação. Desde o caso Atala Riffo vs. Chile (2012), a Corte IDH considera que a orientação sexual e a identidade de gênero são categorias protegidas pela CADH.

A Opinião Consultiva 24 (2017) também incluiu a expressão de gênero como categoria protegida, de modo que nenhuma norma, decisão ou prática de direito interno, seja por autoridades estatais ou por particulares, pode diminuir ou restringir, de forma alguma, os direitos de uma pessoa com base na sua orientação sexual, na sua identidade sexual e/ou a sua expressão de gênero.

O Tribunal tem reconhecido que as pessoas LGBTQIA+ têm sido historicamente vítimas de discriminação estrutural, estigmatização e diversas formas de violência e violações a seus direitos fundamentais.

Reconhecida a responsabilidade do Peru, a Corte determinou às empresas que (i) formulem políticas para abordar a sua responsabilidade de respeitar os direitos humanos e incluir expressamente nelas os direitos das pessoas LGBTQIA+; (ii) exerçam a devida diligência para detectar, prevenir e mitigar qualquer impacto negativo, potencial ou real, que tenham causado ou para o qual tenham contribuído no gozo de seus direitos humanos pelas pessoas LGBTQIA+, ou que esteja diretamente relacionado com as suas operações, produtos, serviços e relações comerciais, bem como ser responsáveis pela forma como os abordam, e (iii) procurem resolver quaisquer impactos negativos que tenham causado ou para os quais contribuíram em face dos direitos humanos, estabelecendo mecanismos de reparação por conta própria ou cooperando com outros processos legítimos, incluindo o estabelecimento e a participação em mecanismos eficazes de reclamação a nível operacional para indivíduos ou comunidades afetadas.

Aos Estados, à Corte determinou o desenvolvimento de políticas adequadas, atividades de regulamentação, monitoramento e fiscalização para que as empresas adotem ações que visem eliminar todo tipo de práticas e atitudes discriminatórias contra a comunidade LGBTQIA+.

No Brasil, a jurisdição da Corte IDH é vinculante (art. 62, CADH) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomenda aos órgãos do Poder Judiciário a observância da jurisprudência da Corte IDH (art. 1º, I, Recomendação 123/2022).

Além disso, o Brasil – há 14 anos consecutivos – também é o país que mais mata travestis, mulheres e homens transexuais no mundo, de acordo com o relatório desenvolvido pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e registra uma média de uma morte de pessoa trans a cada 34 horas, e dá a essa população uma expectativa de vida de 35 anos (enquanto da população geral é de 74,9 anos).

Recentemente, o Ministério Público Federal (MPF) no Acre ajuizou ação civil pública contra a União e o Twitter, para que adotem medidas de combate à transfobia e a proteção à população transexual na internet, motivado pela recente alteração da rede social dirigida por Elon Musk, que deixou de enquadrar a transfobia nas práticas de discurso de ódio.

Além disso, pede-se que a União saia da inércia e enfrente, em um processo estrutural, o problema da transfobia nas redes sociais para investigar, punir e reparar essas violações.

Espera-se, finalmente, que o Brasil consiga reduzir a quantidade de violências virtuais contra as pessoas transexuais, fiscalizar as empresas em relação à proteção da comunidade LGBTQIA+ e combater o discurso de ódio.

*O autor deste artigo ajuizou a ação civil pública contra o Twitter e a União mencionada no texto

LUCAS COSTA ALMEIDA DIAS – Procurador da República, coordenador do GT-LGBTQIA+ da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (MPF) e integrante do Coletivo Transforma MP.

Que haja amanhã: 35 anos da Constituição

Por Leomar Daroncho no Correio Braziliense

O STF vem demonstrando especial zelo na missão de respaldar os acordos assumidos pelo Brasil perante o mundo civilizado, que demandam ações ambientalmente sustentáveis

“Tudo quanto fere a Terra, fere também os filhos da terra.”
Cacique Seattle, 1855.

“Documento da liberdade, da democracia e da justiça social”, foi como o deputado Ulisses Guimarães anunciou, em 1988, a Constituição da República Federativa do Brasil, que chega aos 35 anos neste dia 5 de outubro. A Constituição Cidadã documentou a esperança de tempos melhores. A nossa Constituição comporta muitas possibilidades de análise. Vamos nos ater, neste espaço, há uma questão que, por razões óbvias, centraliza as atenções do mundo civilizado: a preocupação com o meio ambiente.

Estudiosos identificam a interferência do homem como causa do conjunto de eventos climáticos extremos — enchentes, incêndios, nuvens de fumaça e areia, fome, deslizamentos, secas, aquecimento, rompimento de barragens, pandemias, desmatamento, ciclones, envenenamento de abelhas —, além das moléstias crônicas, invisibilizados pela subnotificação. Nessa perspectiva, a Carta de 1988 é um marco fundamental quanto às possibilidades de resistência a um cenário assustador.

A preocupação ambiental constou, timidamente, desde a Constituição imperial de 1824, com referências à saúde e às competências legislativas para a exploração de recurso naturais. A Constituição de 1967, na Emenda nº 1/1969, por obra dos ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, inovou ao empregar a o termo “ecológico”, no art. 172. Os militares preocuparam-se com o “mau uso” de terras agrícolas, que o impediria o proprietário de receber incentivos e auxílios do governo.

“Documento da liberdade, da democracia e da justiça social”, foi como o deputado Ulisses Guimarães anunciou, em 1988, a Constituição da República Federativa do Brasil, que chega aos 35 anos neste dia 5 de outubro. A Constituição Cidadã documentou a esperança de tempos melhores. A nossa Constituição comporta muitas possibilidades de análise. Vamos nos ater, neste espaço, há uma questão que, por razões óbvias, centraliza as atenções do mundo civilizado: a preocupação com o meio ambiente.

Estudiosos identificam a interferência do homem como causa do conjunto de eventos climáticos extremos — enchentes, incêndios, nuvens de fumaça e areia, fome, deslizamentos, secas, aquecimento, rompimento de barragens, pandemias, desmatamento, ciclones, envenenamento de abelhas —, além das moléstias crônicas, invisibilizados pela subnotificação. Nessa perspectiva, a Carta de 1988 é um marco fundamental quanto às possibilidades de resistência a um cenário assustador.

A preocupação ambiental constou, timidamente, desde a Constituição imperial de 1824, com referências à saúde e às competências legislativas para a exploração de recurso naturais. A Constituição de 1967, na Emenda nº 1/1969, por obra dos ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, inovou ao empregar a o termo “ecológico”, no art. 172. Os militares preocuparam-se com o “mau uso” de terras agrícolas, que o impediria o proprietário de receber incentivos e auxílios do governo.

recente confirmação de que o Brasil (Belém – PA) foi escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) para sediar a Conferência do Clima de 2025 (COP-30), em novembro de 2025, é uma singular oportunidade para que o país assuma o protagonismo no tema, mostrando-se ao mundo. Também é um chamado para a responsabilidade, das instituições e da sociedade, de efetivar a pauta considerada prioritária e emergencial, conforme Declaração Política da Cúpula dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, adotada de forma unânime pelos 193 Estados-membros da ONU, em 18/9/2023.

Temos uma pauta com diversas práticas e iniciativas que podem ter sua compatibilidade questionada perante a Constituição e os compromissos internacionais do Brasil. É o caso do Projeto de Lei n° 1459/2022 (Lei dos Agrotóxicos), em tramitação no Senado, que ignora evidências e o alerta da comunidade científica quanto aos danos à saúde pública e ao meio ambiente. Diante dos descuidos na tessitura da teia da vida, a Constituição e a firme postura do STF seguem sendo alento e esperança de que haja amanhã, para as presentes e futuras gerações, e que a Carta de 1988 possa comemorar muitos anos.

Carta de apoio à candidatura de juristas negras ao STF 

O Coletivo Por Um Ministério Público Transformador – Transforma MP, em conformidade com o seu compromisso de atuar para a redução da desigual representação de gênero e de raça nos órgãos do sistema de justiça brasileiro e especialmente na sua Corte máxima, manifesta seu apoio às candidaturas das juristas negras e progressistas Adriana Alves dos Santos Cruz, Lívia Maria Santana e Sant´Anna Vaz, Soraia da Rosa Mendes e Vera Lúcia Araújo para compor a cadeira na Suprema Corte. Assim fazendo, somos coerentes com nossa Carta de Princípios e com nossas Propostas de Reforma do Sistema de Justiça – documentos amplamente divulgados.

A aposentadoria da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, em outubro deste ano abre um leque de possibilidades em relação à escolha da jurista que ocupará sua cadeira.

A democracia brasileira tem se notabilizado pelos esforços de ampliar os espaços de representação de parcelas de sua população historicamente vulnerabilizadas, como as mulheres e os negros. Na eminência de se completarem 35 anos da promulgação da Constituição, não se justifica que o órgão de cúpula do Judiciário permaneça como o retrato da exclusão e da preterição do maior grupo populacional do país, o feminino e o negro. Sequer se trata de abarcar minorias, mas sim de permitir que uma maioria submetida a séculos de opressão esteja presente no topo dos Poderes do Estado.
Sendo o STF é uma instituição fundamental para o funcionamento e garantia da Democracia brasileira, acreditamos ser importante que seus Ministros sejam comprometidos com os direitos sociais e as cláusulas pétreas estabelecidas pela Constituição Federal de 1988.

Entendemos que para uma democracia saudável a população em situação de vulnerabilidade e os grupos minorizados precisam de proteção, cabendo ao Judiciário, como um dos Poderes da República, a atuação contramajoritária, contribuindo efetivamente para combater as desigualdades presentes na sociedade brasileira.

Só é possível construir uma sociedade justa com respeito às diferenças, enfrentando-se o machismo, o racismo, a homofobia e o preconceito de classe dentro dos espaços de poder. A efetiva promoção e proteção dos Direitos Humanos – objetivo do Estado brasileiro e matéria em última análise sob o manto da Corte Constitucional – pressupõe que a própria composição do Supremo Tribunal Federal sinalize a igualdade de gênero e de raça.
Ademais, é necessário que tenhamos votos favoráveis aos Direitos Humanos – que foram duramente atacados e subtraídos durante os últimos anos, principalmente no que se refere a população pobre, negra e periférica.

Em 132 anos de Suprema Corte, apenas três ministros negros foram indicados: Pedro Augusto Carneiro Lessa, Hermenegildo R. de Barros e Joaquim Barbosa, sendo apenas este último efetivamente nomeado.

Trazer diversidade para composição da Suprema Corte é, pois, dar cumprimento efetivo não apenas a nossa Carta Magna, mas às normas do direito internacional, como a Convenção Interamericana Contra o Racismo, norma que foi internalizada com status de norma constitucional (Decreto nº 10.932/2022), que em seu art 9º explicitamente traz o compromisso dos Estados-Partes de garantir que seus sistemas políticos e jurídicos reflitam adequadamente a diversidade de suas sociedades, a fim de atender às necessidades legítimas de todos os setores da população.
A inédita nomeação de uma mulher negra para a Suprema Corte fará justiça à luta contra a opressão e demonstrará, uma vez mais, o compromisso da Presidência da República e do Senado Federal com o pluralismo democrático e a valorização da riqueza cultural e social de nosso país.

É por isso que o Coletivo Transforma MP manifesta-se a favor da nomeação das mulheres negras indicadas nesta nota para assumir um cargo inédito na Corte Suprema.

Integrantes do Coletivo Transforma MP promovem mesas durante a semana universitária da UnB

As atividades reuniram personalidades jurídicas como José Geraldo de Sousa Júnior , Ela Wiecko, Eneá de Stutz, e muitas outras. 

Por Marina Azambuja

O Coletivo Transforma MP promoveu, em parceria com outras entidades, duas atividades durante a semana universitária da Universidade de Brasília (UnB), que ocorreram nesta segunda-feira (25). Os integrantes Alessandra Queiroga (promotora MPDFT), Ela Wiecko Volkmer de Castilho (subprocuradora-geral da República aposentada) e Marlon Weichert (procurador da República e coordenador do Coletivo Transforma MP) participaram de mesas de debates sobre democracia brasileira, forças armadas e sistema de Justiça, resultados de projetos coletivos entre o Coletivo Transforma MP, o Fórum Social Mundial Justiça e Democracia (FSMJD), o Direito Achado na Rua, diversas entidades jurídicas progressistas e movimentos sociais.

Os debates reuniram mais de 300 pessoas em auditórios da UnB, sendo mais de 60 pessoas pela manhã e cerca de 250 interessados, à tarde, para discutir questões essenciais do estado brasileiro.

A primeira mesa foi uma atividade autogestionada do Fórum Social Mundial Justiça e Democracia (FSMJD) promovida pelo Coletivo Transforma MP e o Instituto Tricontinental, em parceria com outras entidades, que ocorreu pela manhã e teve como tema “O papel das forças armadas na democracia brasileira”. A mesa foi coordenada por Marlon Weichert e contou com os debatedores Alessandra Queiroga, Vera Lúcia Santana Araújo, Eneá de Stutz, Rodrigo Lentz, Maria Pia dos Santos Lima Guerra Dalledone, José Genuíno Neto e Antônio Sérgio Escrivão Filho.

A discussão foi pautada pelo papel desenvolvido pelas Forças Armadas no país atualmente e como tem impactado a democracia com os resquícios presentes desde o golpe militar que ocorreu em 1964. Outro fato importante destacado pelos participantes é que para reverter esse cenário é necessário reformar as instituições, inclusive o sistema de justiça, para que o povo, trabalhadores e a população vulnerável sejam protegidos. Também ficou destacado que as Forças Armadas são importantes para a soberania, mas precisam se adequar a um projeto nacional e civil de defesa nacional, sendo urgente que as universidades e centros de estudo forme cidadãos, a sociedade civil, aptos a discutirem a Defesa Nacional, sob um aspecto mais amplo e abrangente do que vem sendo tradicionalmente feito.

A segunda atividade ocorreu à tarde e contou com a coordenação de Alessandra Queiroga e Cleide Lemos (ABJD) e dos debatedores Ela Wiecko Volkmer de Castilho, Realezza, GOG, José Geraldo de Souza Júnior, Ney Strozake, Max Maciel, Deise Benedito, Salete Valesan, Fábio Felix, Marivaldo Pereira, André Carneiro, Antonio Escrivão entre outros juristas e representantes de entidades sociais.

Foram 25 pessoas que transmitiram olhares diversos sobre o sistema de justiça brasileiro, sob a perspectiva de movimentos sociais e de representantes das populações marginalizadas e em situação de vulnerabilidade, que não se sentem atendidos pelas instituições. Ficou evidenciado que a questão do sistema de justiça vai além do poder judiciário, necessitando de uma profunda mudança, centrada nas pessoas que mais necessitam.

A principal ideia apresentada nas duas mesas é que a discussão sobre o Sistema de Justiça e a Defesa Nacional precisa ser feita agora, através de seminários e conferências, apoiadas pelo poder público mas mobilizadas pela sociedade civil.

PICA-PAU OU PERNALONGA ou “O seu humor é contra quem ?”

Por Élder Ximenes Filho no GGN

Diz-se que, se produzir arte engajada é difícil, fazer humor “a favor de” é quase impossível! Não sejamos tão radicais

Situemos o debate (ou a zona de combates):

O humorista Léo Lins é condenado a indenizar pessoa transexual por uso indevido de sua imagem em uma piada (https://www.conjur.com.br/2021-out-08/humorista-condenado-piada-ofensiva-mulher-transexual#:~:text=Ao%20manter%20a%20indeniza%C3%A7%C3%A3o%20em,ou%20sexualidade%2C%20e%20g%C3%AAnero%22.).

O humorista Rafinha Bastos é condenado a indenizar a cantora Wanessa Camargo e família por piada sobre sua gravidez (https://www.jusbrasil.com.br/noticias/humorista-condenado-a-indenizar-cantora-e-familia-por-danos-morais/2993257)

O humorista Fábio Porchat é “cancelado” ao defender que liberdade de expressão inclui piadas de mau-gosto e preconceituosas, desde que não configurem crime (https://www.metropoles.com/entretenimento/fabio-porchat-diz-que-humoristas-tem-direito-de-ofender)

O filósofo Slavoj Zizek manifesta-se contra versão do “politicamente correto” no humor, em artigos sobre o massacre da revista Charlie Hebdo (https://blogdaboitempo.com.br/2015/02/16/eu-sou-estupido-e-maldoso-zizek-esclarece-sua-posicao-sobre-o-je-suis-charlie/)

O humorista estadunidense George Carlin, abertamente de esquerda, condena humor em cima de minorias, mas vê a censura como um mal maior (https://youtu.be/F8yV8xUorQ8)

O artigo acadêmico “Só Porque Você se Ofendeu Não Significa que Esteja Certo: uma perspectiva de linguagem, comédia e ética” bem avança na discussão, mas não a resolve tão bem quanto se propõe: (https://cupola.gettysburg.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=1071&context=student_scholarship)

Existem listas googláveis de filmes de comédia (que você viu se tiver mais de 50 anos) mas que jamais seriam feitos hoje em dia, haja vista conteúdos ofensivos e abertamente de mau-gosto para a atualidade. Incluem-se obras clássicas do grupo Monty Pyton e do diretor Mel Brooks. De brasileiras temos o “Histórias que Nossas Babás Não Contavam”, de Oswaldo de Oliveira (1979), parte dos filmes dos Trapalhões e dos quadros de Chico Anysio. Porção apreciável das alegadas 60 mil piadas reunidas por Ary Toledo (5.000 escritas durante a pandemia) tinham cunho misógino e racista…

Há quem fale no declínio da própria comédia como gênero, mas não temos espaço para tão altas elucubrações. Ficamos em que até mesmo a bilionária Holywood tem mudado. E vejam que estamos falando da ponta-de-lança ideológica do “soft-power” que naturaliza a dominação do império no mundo inteiro. Não é pouca coisa!

Creio que isto já dá uma boa idéia da dimensão do problema em termos objetivos. Construamos a partir daqui, nos limites de nossa prosa – que talvez nem seja séria, apenas desengraçada.

Theodor Adorno falou sobre a (im)possibilidade de fazer poesia depois de Auschwitz. Muitos não vão além deste dictum, que serviu mais como provocação sobre as contribuições da cultura germânica do que como uma maldição sobre o futuro da arte. Aqui um vídeo elucidativo sobre a obra “Dialética Negativa”, para quem não tem tempo de ler mas curte audiolivros: https://youtu.be/cyCTMMH7qV8?si=yGyKwpZbXrzWQ6y-.

De todo modo, reforça-se a indagação de para onde estaria caminhando a arte ocidental? Ou melhor: o caminho, seja qual for, terá ainda risos?

Podemos partir da classificação aristotélica dos gêneros teatrais, começando pela tragédia, que conteria uma ação dramática de excelência, com narrativa completa (início, desenvolvimento e conclusão), linguagem elevada e culta, provocando temor e pidedade no público, com objetivo de purgar as emoções (catarse), educando o espírito para superar os desafios da vida e tornar-se bom, belo e virtuoso (kalokagathia).

Ufa – não é para menos que os deuses massacram todo mundo, a mãe mata os filhos e a gente bate palma… olha que nos festivais de Dioniso as competições eram de três em três peças – com torcida, apostas, lembrancinhas, celebridades e tudo!

A comédia (que em grego tem a ver com “canto” e “festa”) faz o contraste. Em linguagem simples e até grosseira cuidava de situações mais mundanas, continha ironias e críticas a comportamento do dia-a-dia, exagerava e ridicularizava pessoas em busca do riso. Sócrates aparece “abobalhado” no As Nuvens de Aristófanes e os medrosos borravam as calças… Eram encenadas nos dias seguintes aos das Tragédias, cinco de uma vez. Serviam de linimento para que os cidadãos se recuperassem da “pancada” anterior. Depois vinham as premiações e muita festa.

Dois mil e quinhentos anos passaram. Claro que neste tempo todo as coisas misturam-se, repetem-se e recriam-se. Mas aqueles “gatilhos” em nossas mentes (independentes da língua ou da cultura) continuam funcionando e despertando reações. Seriam até clichês: a injustiça dos poderosos; o orgulho ao final castigado; o prêmio da perseverança; o choro das mães e…. a casca de banana, o susto do balde d’água. As comédias de situação ou físicas ou “pastelão” são eternas em sua simplicidade – Carlitos, Monsieur Hulot e Trapalhões. Nossos primos gorilas, bonobos e chimpanzés riem uns dos outros e fazem provocações e galhofas… nós continuamos, como bons primatas… Nosso cérebro tem algum tipo de conexões, um certo arranjo que nos torna animais que riem. As relações sociais sofisticadas, economicamente, juridicamente e eticamente complexas – estas é que nos fazem perguntar: devíamos?

Queiramos ou não, continuam funcionando os chistes, que seriam a unidade mínima da comédia. A palavra vem do alemão “witz” (gracejo ou pilhéria). Daí “wit” em inglês, como a capacidade de dialogar com humor, velocidade e inteligência. Freud (https://www.psicanaliseclinica.com/chistes/) considerava o chiste uma das válvulas de escape do inconsciente, comunicando o que não se ousa, através de vias tortas e inferências (eu não digo, mas você adivinha). Do salto entre o não-dito e o captado surge a graça e o riso.

Percebe-se que a comédia que utiliza o texto e não o gestual exige mais da compreensão verbal – daí ser quase impossível traduzir a obra dos irmãos Marx e sua metralhadora de trocadilhos. Mas existe algo que acompanha a evolução da comédia desde o imemorial das pinturas rupestres. Ora, não me digam que não havia humor em algumas das pinturas com orelhas de coelhos, falos gigantes, orgias e danças cambalhoantes nas rochas de Lascaux/França, Baja/México ou na piauiense Serra da Capivara!

Sempre houve um sentimento de medo e deslumbre ante a natureza, a morte, os sonhos – origens das mitologias e religiões. Em paralelo, o fenômeno irresistível do riso e do humor – mesmo quando não tínhamos palavras, teorias ou classificações para isto. É importante frisar que o humor é original e essencialmente anárquico e surpreendente. Resiste ao enquadramento mais do que quaisquer outras formas de expressão. Produz riso ao expor o ridículo de tudo aquilo que se pretende muito sério e importante (e isto pode incluir as boas causas e os heróis). Isto está na base da arte da palhaçaria, desde a Comedia dell’Arte. O humor é naturalmente contestador e “contra tudo o que está aí”. Acrescento que também é contra o que está “acolá” e, especialmente, “aqui”.

Possui, sempre, grande potencial de ofender!

Diz-se que, se produzir arte engajada é difícil, fazer humor “a favor de” é quase impossível! Não sejamos tão radicais: produzir algo de qualidade é sempre difícil em todos os lugares e épocas, mas aí estão as obras de Maiakóvsky (tão longe) e dos gigantes Agildo Ribeiro e Jaguar (tão pertinho).

De tudo pode-se tirar uma certeza: a “forma” do chiste e sua graça irresistível podem manifestar-se sobre quaisquer temas… até os terríveis! Não ressalto nem a polêmica do A Vida é Bela de Roberto Benigni (humor num campo de concentração demonstrando a superioridade da força vital sobre a barbárie). Falo de situações bem mais corriqueiras e chãs. Repare bem: via de regra, numa piada ou num videoziinho engraçado, sempre há alguém dando-se mal de algum jeito: uma queda, um susto, um ridículo, uma decepção… Extrapolando, quero pontuar a existência de piadas que não deveriam existir, sobre sofrimentos e atos monstruosos – como pedofilia e racismo – mas que existem e enquadram-se como “humor”. Torturadores faziam graça e riam entre si. Crianças podem rir quando vêem alguém machucar-se. Nós começamos a sorrir quando algém começa em ton jocoso: “Sabe o fulano, pois então…”. Este humor inato pressupõe, normalmente, uma compartilhada presciência de que algo ocorre/ocorreu de forma engraçada – mesmo que o fato em si não o seja. O fenômeno do riso pode veicular crueldade, mas vem dos mesmos arquétipos e e das mesmas conformações mentais de cada um de nós. Aqueles risos, por abjetos que fossem, integram o terrível amálgama da natureza humana. Acreditar na excepcionalidade do mal (e não em sua banal repetibilidade) é um erro que devemos evitar, com bem ensinou Hannah Arendt.

Hoje em dia, palavras sobram e como! Com o advento das redes sociais, nunca se escreveu tanto na história da humanidade. Com o Youtube e o TikTok, nunca se filmou tanto. Da mesma forma, jamais se falou ou mostrou-se tanta bobagem! Mesmo que a qualidade surja da quantidade depurada, isto leva algum tempo e esforço. Seguindo o fluxo, obras humorísticas multiplicam-se ao infinito. Todos sabem que os conteúdos mais chamativos, ofensivos, lacradores e polêmicos recebem mais visualizações e podem dar mais dinheiro. Comediantes-influenciadores brotam e desaparecem como os filósofos-influenciadores, os investidores-influenciadores, personais-influenciadores… todos surfando na onda dos “coaches” (e a maioria morre na praia, sedenta de monetização).

Como em quaisquer atividades humanas, tende-se à especialização. Comediantes fazem o velho show de piadas (o gourmetizado “stand-up”) e, naturalmente, formam seus públicos. Há poucos generalistas reais e a fluência das bilheterias (e “likes”) vai depurando o que atrai certo público e o que afasta outro.

Um bom exemplo é o de Bruna Louise (primeira mulher brasileira a ter um show solo na Netflix). Ela faz humor de costumes, sempre abordando sexualidade com um viés feminista e traz situações da própria vida (ficcionalizadas, claro). Atualizando a tradição do palhaço, ela brinca consigo mesma, compartilhando situações hilariamente vexatórias. Expõe ao ridículo os “hétero-top” no privado e o patriarcado no público. Atrai fãs correspondentes. Produzem e consomem, assim, um humor que pode ser “ofensivo” (como qualquer outro) – mas escolhe atuar contra quem é privilegiado na sociedade ou, pelo menos, contra quem não está sob algum risco existencial.

Exemplo contrário é o do sobredito Leo Lins (e outros). Não é difícil deduzir que seu público seria formado por homens brancos inseguros das próprias masculinidade e competência profissionais. Logo, adotam os “espantalhos” dos movimentos feminista, negro, dos povos originários, LGBTQIA+. Coerentemente, são contra cotas, contra imigração, contra nordestinos…. Enfim, produzem e consomem o humor que é também “ofensivo” em potencial (como qualquer outro) – mas escolhem como objetos discursivos os grupos minorizados ou pessoas sob risco existencial.

Mas existe algo ainda mais insidioso que às vezes passa despercebido: não seria tão problemático este humor se apenas se fixasse em contradições internas, exageros e eventuais momentos ridículos. A questão maior é que aponta para a naturalização sistêmica e cultural dos processos de exploração e submissão. Acaba, pior do que ensinando, comemorando que as coisas “são como são” e reforçando que ridículo é tentar mudar o status quo.

As palavras têm poder e o humor desnuda até os reis… mas também pode chutar quem já está caído. Daí a frase tão correta: o humor não tem limites, mas os humoristas devem ter.

onde entram os personagens de desenho do título?

Bem, se você assistiu os episódios clássicos de Pica-Pau (do inicial “Knock knock” de 1940 até a virada do “Barbeiro de Sevilha” de 1944) percebeu que se trata de um perfeito sociopata – embora muito engraçado. É aquela versão com pernas listradas e dentes bem aparentes. Ele sadisticamente abusa de outros personagens mais fracos, sem qualquer provocação, apenas pelo prazer de maltratar e humilhar. Ele só admite fazer as coisas “do seu jeito”, apesar do direito alheio.

Da mesma Warner Brothers, estreando em abril de 1938, o Pernalonga também destrói hilariamente seus adversários. Todavia, isto ocorre em resposta a uma provocação: ele está sendo caçado ou teve a toca destruída (certa vez pela especulação imobiliária). Daí, defende seus direitos e vinga-se!

Claro que todos são circunscritos pelo ambiente cultural da época. Claro que não é nenhum crime gargalhar com ambos. Mas fica a provocação: quando escuta uma piada, lá no fundo, você ri com o Pica-Pau ou com o Pernalonga?

Por Élder Ximenes Filho, Mestre em Direito Constitucional, Promotor de Justiça e Membro do TRANSFORMA MP

O texto não representa necessariamente a opinião do Coletivo Transforma MP.

O acerto e o erro de Lula em relação ao trabalho por plataforma digital

Por Rodrigo Carelli no GGN

As “plataformas digitais˜ utilizam seu aparato técnico e seu capital para empregar uma população racializada, descartável e marginalizada

Lula acertou em cheio. No discurso de abertura da assembleia geral da Organização das Nações Unidas em setembro de 2023, o presidente da República afirmou que as plataformas digitais não podem abolir os direitos trabalhistas duramente conquistados pela sociedade democrática.

A fala não poderia ser mais feliz. As empresas que se autodenominam plataformas digitais são, em verdade, a ponta de lança de um movimento mais amplo de destruição e desonra dos compromissos assumidos com os trabalhadores no século passado. As chamadas “plataformas digitais˜, que promovem o discurso de que representam a modernidade e o avanço tecnológico da sociedade, na realidade utilizam seu aparato técnico e seu imenso capital para empregar uma população racializada, descartável e marginalizada na realização de serviços arcaicos, mal remunerados e completamente desprotegidos.

Basta observar os serviços prestados pelas principais empresas chamadas de “plataformas digitais” para vermos que não nenhuma novidade ou modernidade: transporte de pessoas, entrega de mercadorias e serviços domésticos. Todos sabemos que esses serviços existentes há séculos são historicamente realizados pelo mesmo grupo populacional, antes escravizado e depois liberto e continuamente precarizado. São serviços subalternos por natureza, tendo sua precariedade agravada pela forma de contratação por peça ou tarefa, sem reconhecimento da condição jurídica de empregado, ou seja, sem a consideração dos trabalhadores como sujeitos de direitos fundamentais constantes em nossa Constituição.

Não há nenhuma especificidade no trabalho controlado por meio de plataforma digital. Para além da retórica empresarial, proposital ou inadvertidamente repetida pelas mídias e até em trabalhos acadêmicos, uma plataforma digital nada mais é do que uma infraestrutura eletrônica que, associada a outra física, permite a uma empresa realizar seu negócio. Não há um ramo empresarial ou econômico específico em relação às empresas que se chamam de plataformas digitais: as principais, como dissemos, atuam no ramo de transporte de pessoas, de mercadorias ou de prestação de serviços domésticos. Mais absurda ainda é a caracterização de “trabalhador por aplicativo”. Um aplicativo nada mais é do que a interface final de comunicação e controle entre a plataforma digital da empresa e seus clientes e trabalhadores.

No acelerado processo de digitalização da sociedade, toda empresa, em um futuro bem próximo, realizará seu negócio, seja ele qual for, total ou parcialmente por meio de plataforma digital. As infraestruturas digitais e físicas já coexistem em negócios tão distintos quanto bancos, supermercados, locadoras de automóveis, imobiliárias e lojas de varejo, sem que a natureza desses negócios seja modificada de maneira mágica pela mera utilização de instrumentos tecnológicos. Seres humanos continuam sendo seres humanos na digitalização, com as mesmas necessidades, desejos e vontades.

Alguns apontam que a novidade do trabalho em plataforma estaria no pagamento por tarefa, ou na possibilidade de recusa ou escolha de trabalho. Novidade nenhuma. Os trabalhadores avulsos podem escolher as tarefas a serem realizadas, e são pagos por peça, e ainda assim são detentores de todos os direitos trabalhistas. Da mesma forma, o precário trabalho intermitente, mal desenhado, é considerado pela como forma de emprego. A inexistência de um controle de jornada é própria do teletrabalho, como previsto expressamente na lei. E mesmo assim continuam sendo empregados e com todos os direitos. Além disso, as empresas de entrega que se utilizam de plataformas digitais, por exemplo, põem em ação instrumentos que, ao contrário da retórica, impõem horários e turnos aos trabalhadores e obrigação de aceitar automaticamente toda chamada ao trabalho, sob pena de redução na oferta de trabalho. Outras “plataformas” ajuízam ações judiciais em face de empresas para impedir que forneçam aos trabalhadores mecanismos digitais que lhes permitam a escolha de trabalhos mais bem remunerados.

Assim, a fala de Lula mostra extrema lucidez: como não há especificidade nenhuma no trabalho realizado por meio de plataforma digital, o modelo por elas realizado pode ser replicado a todo e qualquer negócio, destruindo os direitos dos trabalhadores que foram conquistados a duras penas no século XX. A fala de Lula deixa a entender também que esses direitos conquistados são parte de um compromisso que sustenta a democracia. Sem o cumprimento do pacto, a democracia se esfarela. O alastramento de vitórias eleitorais de extremistas “antissistema” não deve causar nenhuma surpresa, pois amplamente apoiada por uma população desiludida e descrente devido ao constante e crescente descumprimento das promessas democráticas.

Mas Lula também errou em cheio. Não em sua fala na ONU, mas na constituição de um grupo de trabalho para discutir o trabalho em plataforma digital, como se ele tivesse alguma especificidade. A comprovação da inexistência de uma especificidade que una os trabalhadores controlados por plataforma digital é que a discussão no grupo de trabalho afunilou para a discussão das condições de trabalho e de remuneração de motoristas de transporte pessoal e de entregadores, esquecendo-se dos demais negócios realizados por outras empresas. Tudo ficou ainda mais claro na criação de negociação de forma separada entre motoristas e empresas de transporte e entregadores e empresas de delivery. O grupo de trabalho se transformou, em realidade, em uma mesa redonda de mediação de negociação coletiva , como centenas de outras que acontecem diuturnamente por todo o país em todas as categorias de trabalhadores.

Lula errou porque, além de não haver nenhuma especificidade no trabalho controlado por infraestrutura digital, o processo de uberização do trabalho vai muito além do trabalho plataformizado, atingindo profissões como manicures, motoristas de carga, médicos, enfermeiros, advogados, trabalhadores em marketing e tecnologia da informação, engenheiros, trabalhadores em construção civil, professores e muitas outras. A pejotização está sendo amplamente utilizada, e em grande parte legitimada pelo legislativo e judiciário, principalmente pelo Supremo Tribunal Federal, fazendo com que a parte excluída do âmbito do direito do trabalho, ou seja, dos direitos fundamentais previstos em nossa Constituição, seja cada vez maior em relação àquela protegida pelos direitos duramente conquistados e que são base de sustentação da nossa democracia. O trabalho intermitente foi inserido na legislação trabalhista, legitimando o modelo de contratação por demanda, e que, apesar de mal regulado, inexplicavelmente não está sendo utilizando nem discutido no trabalho por plataforma digital. Como discutir as duas coisas de forma separada?

Flerta-se com um erro ainda maior quando se anuncia que o governo quer, no âmbito do grupo de trabalho, buscar um acordo que praticamente cria uma terceira categoria de trabalhador no país, com alguns parcos direitos, esquecendo-se da lista de direitos fundamentais previstos no art. 7º de nossa Constituição, legitimando, ao final, as duas pretensões dessas empresas estrangeiras: quebrar o direito do trabalho, criando uma subcategoria de trabalhadores e impor um modelo que não considera todo o tempo à disposição como tempo de trabalho. A busca do trabalho decente, como pactuado com o governo estadunidense, passa no Brasil pelo cumprimento dos direitos fundamentais explicitados na Constituição. Trabalho em nível abaixo dos direitos fundamentais é trabalho indecente.

O trabalho controlado por plataforma digital deveria ser discutido de forma tão ampla quanto é o processo de digitalização da sociedade e não com estupefação frente à utilização de tecnologias para a realização de prestação de serviços comezinhos em nossa sociedade. Não poderia nunca estar sendo discutido como se fosse um fenômeno autônomo, desvinculado do processo de uberização geral e de esvaziamento subjetivo do direito do trabalho. O fenômeno deveria estar sendo discutido em um processo amplo de revisão da reforma trabalhista, do trabalho intermitente, da pejotização, em uma verdadeira modernização da nossa legislação, adequando-a ao projeto democrático inscrito em nossa Constituição.

Como Lula acertou em cheio em seu discurso na ONU, há tempo de rever o erro e acertar também em relação ao Grupo de Trabalho no Ministério do Trabalho, ampliando-o para abarcar uma revisão da legislação trabalhista para atingir os objetivos de nossa Constituição, que tem os direitos trabalhistas como direitos fundamentais. Deveria propor que os trabalhadores, seja qual rótulo lhe seja dado, são merecedores dos direitos fundamentais descritos na Constituição, conforme inclusive consta no caput do art. 7º: são direitos dos trabalhadores aqueles ali descritos, além de outros que visem à melhoria da sua condição social. Isso é essencial e condição para a permanência e o reforço da democracia no país. Como disse Lula na ONU, “estabilidade e segurança não serão alcançadas onde há exclusão social e desigualdade.” O crescimento da quantidade de trabalhadores desiludidos, desamparados, desenganados, desesperançados, ressentidos e abandonados só nos levará à quebra dos laços democráticos que nos unem, quem sabe de forma irreversível. A hora de reatar os laços é agora.

Rodrigo de Lacerda Carelli, Procurador do Trabalho na PRT/1, Professor da UFRJ e membro do Coletivo Transforma MP

O texto não representa necessariamente a opinião do Coletivo Transforma MP