O Coletivo por um Ministério Público Transformador lançou nota de apoio aos comunicadores sociais, destacando a gama de dispositivos constitucionais, legais e de normas internacionais que protegem o direito à informação.
Leia a íntegra da nota:
NOTA DE APOIO AOS COMUNICADORES SOCIAIS
1. O Coletivo por um Ministério Público Transformador vem a público manifestar-se em defesa do amplo direito fundamental constitucional dos comunicadores sociais a não revelarem suas fontes, conforme estabelecido no art. 5º, XIV, da Constituição Federal: “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.
2. Do mesmo modo, referido direito é garantido pelo art. 19 da Declaração Universal de Direitos Humanos[1], pelo art. 19.2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos[2], assim como pelo art. 13.1 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos[3].
3. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em sua declaração de princípios sobre a liberdade de expressão[4], confirma que a liberdade de expressão é um direito fundamental e inalienável, além de ser um requisito indispensável para a existência de uma sociedade democrática (princípio 1), esclarecendo a relação entre liberdade de expressão e o trabalho de informação levado a cabo pelos comunicadores sociais. Esclarece que todo comunicador social tem direito à reserva de suas fontes de informação, apontamentos, arquivos pessoais e profissionais (princípio 8) e que pressões diretas ou indiretas dirigidas a silenciar a informação disponibilizada pelos comunicadores sociais são incompatíveis com a liberdade de expressão (princípio 13).
4. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos afirma a “função vital de fiscalização pública que exerce a imprensa”, justificando um alto nível de proteção do direito dos jornalistas de proteção de suas fontes, conforme precedentes dos casos Goodwin contra Reino Unido (sentença de 23 de maio de 1996), e caso Roemen y Schmit contra Luxemburgo (sentença de 25 de fevereiro de 2003).
5. No primeiro caso, o referido tribunal internacional estabeleceu a garantia do direito, afirmando que a exigência de que o jornalista revele o segredo de sua fonte viola o direito humano à liberdade de expressão, previsto no art. 10 da Convenção Europeia de Direitos Humanos, o qual é composto pelas liberdades de receber ou comunicar informações ou ideias, sem a ingerência das autoridades públicas.
6. No segundo caso, extrai-se que o direito do jornalista a não revelar sua fonte inclui não apenas o direito a não identificá-la diretamente, como também o de não revelar qualquer outra circunstância que possa levar a esta identificação, ou seja, também está protegido contra as buscas e apreensões de objetos ou documentos que indiretamente permitam revelar a identidade da fonte.
7. Em documento denominado “Padrões Internacionais sobre Liberdade de Expressão”, o Relator Especial das Nações Unidas sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Expressão e Opinião assevera:
Do mesmo modo, os Estados devem instruir as forças de segurança sobre o respeito aos meios de comunicação e respeitar o direito dos (as) jornalistas ao sigilo de suas fontes de informações, anotações e arquivos pessoais e profissionais[5].
8. Neste sentido, em julgamento da ADPF 130, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a “Lei de Imprensa”, por ser contrária à liberdade de imprensa, de expressão e de informação, afirmando que há uma “relação de mútua causalidade entre liberdade de imprensa e democracia”.
9. Mais recentemente, confirmou a garantia do direito de preservar a fonte jornalística, oponível aos agentes e autoridades do Estado, como garantia institucional de exercício do direito fundamental da liberdade de expressão e de comunicação (buscar e transmitir informações), na Reclamação 21504.
10. Importante definir a extensão do conceito de “profissional” estabelecido pela Constituição Federal de 1988, para fins de garantia do direito fundamental a não revelar sua fonte de informações.
11. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que é inconstitucional a exigência de diploma de curso superior para exercício da atividade de jornalismo, por violar os direitos à liberdade de expressão e de informação, conforme acórdão do tribunal pleno no Recurso Extraordinário 511961/SP.
12. De acordo com o comentário geral nº 34, parágrafo 44, do Comitê de Direitos Humanos da ONU, autores de blogs têm o direito a não revelar sua fonte:
Na função jornalística participam uma ampla variedade de pessoas, como analistas, repórteres profissionais e de dedicação exclusiva, autores de blogs e outros que publicam por sua própria conta em meios de imprensa, na internet, ou por outro meios[6] 13. Trata-se, portanto, de conceito amplo, que pode ser reunido na categoria de “comunicadores sociais”, como no caso de autores de blogs de caráter informativo jornalístico.
14. Por todo o exposto, o Coletivo por um Ministério Público Transformador externa sua preocupação com possível violação do direito à liberdade de expressão, em sua vertente do direito de comunicar informação, por decisão judicial[7] questionável que determinou a condução coercitiva de autor de blog jornalístico para prestar declarações sobre a identidade de fonte, bem como que determinou a busca e apreensão de objetos e quebra de sigilo de dados que podem levar à descoberta da identidade de fonte jornalística. A ingerência, em tese indevida, é uma afronta à liberdade de expressão e à própria garantia de uma sociedade democrática.
Brasília/DF, março de 2017.
Crédito Foto: Associação dos Juízes para a Democracia
Fontes:
[1] “Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão“. Disponível em: Associação dos Juízes para a Democracia
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