Nota Pública: Transforma MP explica as ilegalidades da Medida Provisória do “Programa Verde e Amarelo”

O COLETIVO POR UM MINISTÉRIO PÚBLICO TRANSFORMADOR – TRANSFORMA MP, associação formada por membras e membros do Ministério Público dos Estados e da União, pautando-se nos primados que alicerçam o Estado Democrático de Direito desenhado na Constituição Federal, vem manifestar seu repúdio à Medida Provisória nº 905, de 11 de novembro de 2019.

A normativa, instituidora do “Contrato do Trabalho Verde e Amarelo”, tem por objetivo a alteração de mais de uma centena de dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprofundando a precarização das relações de trabalho já trazida pela malfadada Reforma Trabalhista de 2017.

A MP 905 prevê, ainda, verdadeira ingerência sobre prerrogativas do Ministério Público e sobre normas de direito processual, pois altera a eficácia e a força vinculante dos termos de ajuste de conduta (TAC) firmados pelo Ministério Público do Trabalho, bem como vincula a destinação de multas e penalidades decorrentes destes mesmos TACs e também das ações civis públicas propostas perante a Justiça do Trabalho (arts. 28 e 21, da MP, respectivamente).

A par de restar configurada a inconstitucionalidade formal, nos termos do artigo 62, inciso I, alíneas b e c, da Constituição Federal, causa estranheza que a MP 905 traga em seu texto mecanismos que determinam vacatio legis para a vigência de alguns de seus dispositivos, pois não há como conciliar esta previsão com o requisito básico da urgência que caracteriza uma medida provisória.

Delineia-se igualmente flagrante inconstitucionalidade material, considerando-se que o art. 127 da Carta Magna é de solar clareza ao assegurar ao Ministério Público a independência e autonomia funcional e administrativa, de tal sorte que o Presidente da República não pode interferir no livre exercício das funções de todos os ramos do Ministério Público brasileiro.

A MP determina que os recursos orçamentários advindos de TACs ou ações judiciais propostas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) sejam direcionados ao recém-criado Programa de Habilitação e Reabilitação Física e Profissional, Prevenção e Redução de Acidentes de Trabalho (art. 21, MP).

Nítido, portanto, o tratamento discriminatório e diferenciado reservado ao MPT, alijando-o da aplicação do art. 13, da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública – LACP) e impedindo que os recursos das indenizações decorrentes de TACs e ações civis públicas sejam destinados à reconstituição de bens lesados.

Em vez de fortalecer a fiscalização do trabalho, com incremento operacional e jurídico, medidas que dariam efetividade ao anunciado propósito de reduzir os acidentes de trabalho e proporcionar recursos próprios do Orçamento da União, decorrentes dos autos de infração, para esta atividade, a MP 905 embaralha as atribuições das instituições de Estado. Reserva ao Ministério Público competências típicas do Executivo, equiparando-o à Advocacia-Geral da União e à Procuradoria da Fazenda. Diferente destes dois respeitáveis e importantes órgãos, o MPT não tem atividade arrecadatória, pois eventual resultado financeiro da sua atuação está legalmente vinculado à restauração dos direitos violados.

Desrespeita a LACP, regramento legal dos TACs e das ações civis públicas e coletivas, que dispõe em seu artigo 13 que os recursos das indenizações devem ser destinados à reconstituição dos bens lesados, o que somente se define nos casos concretos, com a participação das instituições e entidades legitimadas para o exercício da ação, dentre as quais figura o Ministério Público.

Ademais, reduz referida reconstituição a direitos de uma única espécie: reabilitação física e profissional, prevenção e redução de acidentes de trabalho – matéria que, embora de extrema importância, não detém a exclusividade da atuação do MPT, instituição cuja atividade abrange o enfrentamento ao trabalho escravo e infantil, à discriminação e às fraudes nas relações de trabalho, às irregularidades laborais na Administração Pública e na área portuária e aquaviária, além de quaisquer outras formas de violação da ordem jurídica e dos direitos fundamentais trabalhistas.

É de se observar que a desconstrução trazida pela Medida Provisória não está isolada, mas faz parte de uma estratégia mais ampla, iniciada com a Reforma Trabalhista de 2017 e edificada diuturnamente nos últimos tempos, de desmantelamento do sistema de justiça e ataque aos direitos humanos laborais, aprofundando a passos largos a precarização do trabalho, a concentração de renda e a desigualdade social em nosso país.

Assim, o COLETIVO POR UM MINISTÉRIO PÚBLICO TRANSFORMADOR, comprometido com a ordem democrática e constitucional, manifesta seu repúdio à MP 905, considerando-a atentatória aos princípios adotados pela República Federativa do Brasil.

Brasília, 21 de novembro de 2019.

Coletivo por um Ministério Público Transformador

COLETIVO TRANSFORMA MP

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