Por Maria Betânia Silva no GGN
Bom ressaltar que a existência do povo negro no território brasileiro e de seus descendentes ocorreu num contexto de expansão capitalista.
I – O PASSADO COMO INFLUÊNCIA
Através da Lei nº12.519/2011, 20 de novembro foi instituído como o dia da Consciência Negra, no Brasil. Dia para ser honrado e celebrado. É data comemorativa para as pessoas negras desfilarem seus turbantes, suas roupas estampadas e bem coloridas, seus cabelos criativos pelo país afora, muito mais do que o fazem no cotidiano. É um dia que impõe quase um ritual de pertencimento, dando provas de que a cultura é uma forma de resistência do povo negro e convidando todo mundo para acompanhar as procissões ritmadas por tambores. Assim, de um lado, é dia de viver e reviver intensamente tradições, criando um ambiente de festa com cantos, com danças e rodas de samba; de outro lado, é dia de muitos encontros para debates, palestras, mesas redondas, lançamento de livros, reflexões, enfim. É uma data repleta de eventos que se espalham pelo Brasil e, na verdade, perpassam quase todo o mês de novembro.
Há também uma outra dimensão da resistência do povo negro e que definiu a escolha do dia 20 de novembro: honrar a memória de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, morto justamente em 20 de novembro de 1695. Portanto, é um efeméride atravessada pela dor a ser dissipada no despertar de luta para construir uma outra sociedade.
É a dor de uma História impiedosa porque, para além de lembrar a morte de Zumbi, lembra quão afetados foram os milhões de africanos submetidos à desumanização pelo colonizador europeu no dentro e fora do território do Brasil. Impossível não lembrar o processo desumanizante que começava nos leilões para a venda das pessoas negras nos mercados em solo africano; mercados como o que existiu na Ilha de Goré, no Senegal, de onde os negros/negras após serem expostos na condição de mercadorias, zarpavam nos chamados “navios negreiros” para o Brasil a fim de serem escravizados.
Digerindo a dor desse passado, 20 de novembro expande uma consciência que nunca pôde ser sequestrada no processo escravagista, bem ao contrário, sempre esteve viva e se reaviva para fincar os pilares de um futuro desejado. O passado do povo negro é lembrança necessária para tornar presente uma construção contínua de emancipação, de afirmação de dignidade e exigência de respeito.
O povo negro, como já dito, foi desterrado da África, trazido para cá, onde literalmente se enterrou, mas nessa terra também renasceu, revivendo a sua ancestralidade e se constituindo como segmento social majoritário na população do Brasil, país que mais recebeu negros africanos em todo o mundo.
Em virtude dessa predominância numérica, o povo negro não perdeu visibilidade, embora tenha perdido em inserção social. Perdeu uma terra e ganhou outra. Dispersado na população brasileira, oscilou entre a resistência organizada e esfacelada, comeu o pão que o diabo amassou e como nunca fugiu da luta, nem foge, ergue a sua bandeira em busca da pátria mãe gentil.
Ser parte do povo negro é exotismo, não é espetáculo, não é só estética, é a força de uma ética forjada na História com o seu desenrolar impactante e com possibilidades de ser esplendorosa em algum momento porque traz uma grande aposta nas formas de organização coletiva segundo a qual tudo é compartilhado em favor do melhor para todos e cada um. Por isso o aforismo Ubuntu: “eu sou porque nós somos”.
Não se pode olvidar que por muito tempo, no Brasil, as lições de História aprendidas nas bancas escolares acerca da escravidão do povo negro, foram, em geral, nutridas pela ênfase em conferir importância ao papel da Princesa Isabel na abolição da escravatura, com a consequente liberdade das pessoas negras, mas excluindo para a ocorrência desse evento, qualquer participação dos negros/ negras na tessitura da ordem social brasileira e na vida política do país. Também evitava- se outrora falar na diáspora africana engendrada pelo tráfico que viabilizou o uso dos africanos como mão-de-obra barata na execução dos planos de conquista e extração de riquezas no território do Brasil/ Pindorama pelo colonizador português, o que, aliás, também com outros colonizadores europeus em certos intervalos de tempo. Exploraram-se os recursos naturais do solo e nenhuma porcentagem dele foi usada para reparação histórica do sofrimento infligido a essa mão-de-obra, não houve compensação. Não houve, por exemplo, uma reforma agrária, voltada ao contingente dos afrodescendentes para lhes fazer ter a sua terra como território de produção dos seus próprios bens. Apesar de tudo, os afrodescendentes criaram os quilombos, tornando-os não exatamente um lugar de refúgio, mas a reprodução de um território com organização política diferente daquela à qual o colonizador pretendeu submetê-lo, tal como registrado por Beatriz Nascimento[1].
Assim fica claro que dos afrodescendentes no Brasil/Pindorama se ocultara, antes da Lei nº12.519/2011, a História sobre os seus heróis da resistência, bem como, se estrangulara o debate para demonstrar desde sempre como a exploração da mão-de-obra negra moldou a nossa economia. E mais, antes da instituição do dia da Consciência Negra, algo muito importante sucedeu: a promulgação da Lei nº10.639/03 que determinou o ensino transversal da História Afro-Brasileira.
Essa lei significou um grande passo para explorar fatos históricos que revelaram, de um lado, o superdimensionamento da Princesa Isabel como personagem da História do Brasil e, de outro, trouxeram justamente à tona o papel de Zumbi dos Palmares como líder do povo negro, resgatando-lhe o orgulho.
Todo mundo que passou por uma escola, antes de 2003 e logo após 2003, sabe perfeitamente que o dia 13 de maio de 1888 sempre foi uma exaltação feita mais à Princesa por causa da assinatura da Lei Áurea do que uma exaltação ao término da escravidão. 13 de maio de 1888 sempre teve gosto de uma concessão, extraindo do povo negro qualquer conquista.
Tornou-se até palatável na História do Brasil a posição da Princesa Isabel na árvore genealógica dos europeus brancos que conceberam o país como “Império sem soberania” e do qual a maioria da população afrodescendente, batalhadora e fiel ao seu território, fora excluída da esfera de poder e de ganhos sociais. Não foram poucos também os estudos de História sempre compartimentados que deixaram de atentar para as injunções políticas de outros países ligados à coroa portuguesa ou em conflito com ela e que tiveram reflexos no contexto da abolição da escravatura, no solo brasileiro, tornando invisíveis as lutas e a labuta que o povo negro teve que enfrentar.
Alega-se que Princesa Isabel, fez o que de melhor podia ser feito à sua época. Mas o seu ato também abriu o caminho para enxergar um universo cheio de fantasias sobre o futuro, dourando a pílula do sofrimento interminável da parcela majoritária da população, que foi largada à própria sorte, comprometendo a liberdade obtida.
Passados quase quatro décadas da abolição da escravatura, os negros vagavam no país enquanto políticas de Estado foram implementadas para promover o branqueamento da população, justificadas como doses alvissareiras de futuro. Ao mesmo tempo, medidas repressivas ganhavam espaço para reaprisionar os corpos negros, subtrair-lhes a posição de sujeitos de uma História e inibir as suas manifestações culturais, nunca esquecidas por eles e sempre revividas, reinventadas como forma de resistir, existir e manter íntegra a consciência sobre o seu passado na busca do futuro que desejavam.
Deve-se à Lei nº10.639/03, portanto, o escancaramento do absurdo existente entre a História de um país que foi manipulada pelos vencedores e um Conto de Fadas. São muitas as semelhanças artificialmente forjadas e muito mais diferenças, estas, bem reais. Talvez a mais evidente diferença resida no fato de que a História é interminável enquanto o Conto de Fadas tem um fim e o seu final é sempre feliz, apesar das maldades de alguns dos personagens.
A História, contudo, é processo; o Conto de Fadas é produto! Na História há um ciclo que oscila entre dramas e superação sem garantia alguma do final feliz; no Conto de Fadas há uma linearidade que termina quando o drama é superado. Em ambos, contudo, há narradores, vilões e heróis que são inseridos numa dualidade viciosa entre alguém que faz o bem e alguém que faz o mal. Essa dualidade parece ter-se plasmado como indispensável para nos acostumarmos a estudar e/ou a escutar História como se fosse estória. Faltou admitir a dialética!
A História do Brasil foi assim, por muito tempo, embalada numa versão congelante de um Conto de Fadas. Reis e rainhas, príncipes e princesas habitaram o nosso chão por séculos. A tal ponto que a ideia de realeza até hoje se manifesta naturalmente no uso de designativos como Império ou Rei, para atestar uma excelência (que é falsa) em relação a tudo. Há restaurantes especializados no preparo de frutos do mar que é “Rei das lagostas”, passando pela música, através do “Rei do rock” até chegar em estabelecimentos que vendem baterias para veículos automotores, “Império das Baterias”, por exemplo. O existe de mais próximo da realeza, porém, é a concentração da riqueza e a recusa em compartilhá-la em prol do coletivo, do interesse público.
Esse imaginário cultivado na realeza merece atenção porque ele, do ponto de vista antropológico, tem um peso simbólico importante, aparecendo como um dos fatores que deformaram a própria República quanto à diferenciação entre o público e o privado e que retardaram e, ainda, retardam, uma melhoria na vida pública em favor do coletivo. Uma vez proclamada a República no Brasil, com roupagem de golpe de Estado e mesmo que contaminada pela herança monárquica e escravagista, algo não planejado aconteceu: abriu-se a possibilidade de abraçarmos a democracia, para ampliar a participação popular e suavizar a luta de classes. Mas isso foi emergindo de um modo inesperado. Uma das primeiras ideias democráticas a se estender no tecido social brasileiro foi a da romantização quanto às diferenças assentadas na separação racial imposta sob a lógica colonizadora. Olha aí o viés de conto de fadas.
Consagrou-se “o mito da democracia racial”, lamentavelmente, mascarando-se assim a estrutura classista de uma sociedade que foi erguida sobre a exploração da força de trabalho do povo negro, morador da Senzala e submetido à autoridade do seu Senhor, dono da Casa Grande.
II – UM SALTO PARA O FUTURO
Não há dúvida do salto histórico trazido pela promulgação da Lei nº 10.639/03, a despeito dos muitos percalços ainda existentes. Essa lei tem também o mérito de instituir o ensino transversal da História afro-brasileira[2] na educação básica que é o alicerce da sociedade. A lei institui um resgate de conteúdo da História do Brasil que não precisa ser objeto apenas da disciplina de História, mas, sim, uma abordagem que atravessa qualquer outra disciplina dos currículos escolares. Afinal, a cultura negra e a cultura indígena com todos os saberes ancestrais que delas decorrem se mesclaram aos saberes dos descendentes dos colonizadores. Por apropriação destes últimos, em muitas situações, a roupagem científica cobriu os saberes dos povos dominados como que para deslegitimar a autoria originária deles e assim convertê-los em saberes como que exclusivos do conquistador. Nesse passo, foram eles alçados à categoria de um conhecimento superior, próprio ao modo de ser europeu. Mas, a pesquisa existe para desmontar artifícios sobre a realidade e “dar a César o que é de César”.
Ainda que a Lei nº10.639/03 tenha demorado a ser verdadeiramente compreendida pela maioria dos que têm o dever institucional de implementá-la, ela está aí, sem que possa ser sorrateiramente negligenciada por tantos outros que a conhecem. A instituição do dia 20 de novembro como dia da Consciência Negra, é uma data na qual não se pode usar borracha sobre a História do país, nem dentro nem fora da sala de aula.
A importância dessa lei para uma mudança estrutural da sociedade brasileira (é preciso acreditar que leis possam promover mudanças de dimensão cultural) é indiscutível. Para melhor entender como isso pode se concretizar mais amplamente, a título de exemplo, cabe voltar o olhar para as instituições do país. Isto porque muitas delas foram desenhadas sob a influência de modelos europeus e embora que em alguns aspectos tenham sido adaptadas ao contexto brasileiro, atuam como se estivessem fora do seu lugar.
Nesse sentido, um breve exame da atuação do Ministério Público Brasileiro é bem elucidativa e leva a reivindicar mudanças.
Dentre as inúmeras atribuições constitucionais conferidas ao Ministério Público, cabe-lhe empenho na defesa de direitos fundamentais, dentre eles, o direito à educação. Desse modo, o MP é um órgão legitimado a agir para que a lei da História afro-brasileira seja observada nos estabelecimentos escolares.
Paradoxalmente, porém, a própria instituição ministerial precisa enfrentar e superar problemas de base na sua composição, na sua forma de agir e de pensar porque muitos dos seus membros não incorporaram à sua bagagem intelectual a História afro- brasileira. Majoritariamente formado por pessoas que se declaram brancas, tal como ocorre na Magistratura, muitos membros do MP, instituição integrante do Sistema de Justiça, carecem de consciência sobre o que negritude significa na atualidade e significou na formação do Brasil. Alguns desses membros até sofrem de uma indisposição para adquirir essa consciência.
Nessa perspectiva, ousa-se aqui dizer o dia da “consciência negra”, mesmo que espontânea e naturalmente assumido pelo povo negro do país para marcar a sua resistência à opressão, não implica limitar essa consciência a uma identificação das pessoas de cor preta, como se fosse um atributo exclusivamente delas no espaço de um país que cresceu e se moldou com uma significativa contribuição do povo negro.
É importante ressaltar que a existência do povo negro no território brasileiro e de seus descendentes ocorreu num contexto de expansão capitalista. E se ainda existe uma herança colonial que é baseada numa ideologia de superioridade étnica do branco europeu, essa superioridade se mostra completamente descabida porque o povo negro revelou os seus saberes e a sua capacidade de resistir ao estado de coisas que possa levá-lo a ser a “carne mais barata do mercado”. O povo negro deu provas de como conviver com o diferente sem descurar da humanidade. A “consciência negra” resulta da compreensão quanto às situações de realidade que sucederam no passado e que ainda se projetam no tempo presente como estruturantes da sociedade, para subalternizar os afrodescendentes e oprimi-los. É visível que, no Brasil, a subalternização e opressão recai sobre a população de cor preta, e é justamente por isso que cabe também ao restante da população, em especial, à população que se declara branca, agora, fazer o esforço para conhecer e agir em respeito aos desideratos da “consciência negra”.
Note-se que na área criminal, por exemplo, o Ministério Público, não é uma referência positiva, uma vez que desconsidera, via de regra, as estruturas sociais resultantes do passado escravocrata do país e, nesse sentido, acaba reatualizando esse passado pela reiterada descrença quanto à vulnerabilidade social das pessoas negras, impondo-lhes o peso de um aparato repressivo regido pelo “racismo de marca”, na expressão de Oracy Nogueira.
Assim, tendo o sistema repressivo ao alcance das mãos, o Ministério Público, que é o titular da ação penal, falha ao utilizar esse sistema ampla e seletivamente para aprisionar inocentes pretos e miseráveis ou penalizar, com rigor, autores pretos de ilícitos de pouca monta enquanto poupa de responsabilidades e punição devida pessoas de cor branca, que cometem ilícitos graves. Em outras palavras, às pessoas identificadas como negras aplica-se o peso das penas previstas no Código Penal e só! Às pessoas identificadas como brancas, dá- se um sopro na pena, preservando as garantias constitucionais e a estrita observância do Código de Processo Penal, mesmo que os delitos os mesmos e praticados em circunstâncias idênticas por gente negra e/ou gente branca.
Essa forma de agir, sustentada por uma forma de pensar desprovida de consciência sobre a história da negritude, no Brasil, eleva significativamente o encarceramento das pessoas negras. Portanto, uma dose de consciência negra nas cabeças ministeriais faria avançar a equidade de tratamento no interior do sistema de Justiça.
Convém dizer que como são muitos os membros do Ministério Público oriundos de uma classe socialmente abastada e predominantemente, na pele ou no pensamento, identificados ao branco europeu, há uma recusa talvez inconsciente em conhecer detalhes da História do próprio país e compreender como se deu a formação da sociedade brasileira. Ademais, o desprezo, por conseguinte, em perceber que a luta de classes existe e que no Brasil foi forjada no corte racial imposto pelo colonizador e intrínseca ao sistema capitalista e patriarcal, funciona, numa licença filosófica, para os representantes da branquitude, como um “imperativo moral categórico” de ignorância. Tudo tão retorcido e distorcido que tem potencial para fazer Kant se “revirar” no seu túmulo.
Nesse diapasão, não há como negar: o Ministério Público, com honrosas exceções, comete racismo institucional quanto ao acesso das pessoas negras às garantias processuais consagradas na Constituição, tornando, assim, defeituosa a noção de justiça que também atinge as demais instituições do sistema judicial brasileiro.
Daí porque mudar esse padrão de atuação ministerial, demanda mais do que uma reorientação do exercício das atribuições do MP. O Ministério Público, como instituição, precisa fazer mais, precisa reformular também as formas de ingresso na carreira com aplicação da lei de cotas raciais, com o devido aperfeiçoamento e ajustes para criar um perfil institucional mais fiel à realidade e à diversidade étnica que existe no país.
Nesse particular, a necessária guinada no ensino de História no Brasil e, em particular, da História Brasileira inaugurando um olhar mais atento à diversidade cultural na qual a sociedade brasileira foi edificada, deveria se tornar exigível aos candidatos a cargos no MP, quando da realização do concurso. Com essa medida, vislumbra-se a abertura de uma importante janela no processo de compreensão de identidade cultural brasileira, marcando, assim, certa distância em relação ao estudo contemplativo e mimético da História de países estrangeiros. A janela se abre para dentro do país e não para fora.
III – A EMANCIPAÇÃO DOS INDIVÍDUOS SE REFLETE NA SOBERANIA DO PAÍS
O que se tem de certo, em conclusão, é que após a invasão portuguesa ao Brasil/Pindorama a sociedade brasileira que disso descende não expressa apenas os traços daquele que quis escrever a História de uma conquista, essa sociedade encontra muitos paralelos nos modos de vida africana e indígena e, nesses modos, ela se encontra, se desencontra mas se reencontra no papel daqueles que foram tidos como vencidos no processo histórico porque suas vozes foram silenciadas por muito tempo para não contar o que viram, o que viveram e o que precisaram fazer para não serem eliminados.
Em razão de tudo isso é que o Dia da Consciência Negra para além da celebração da resistência como patrimônio imaterial, fundado na ancestralidade do povo negro que compõe a população brasileira, ganhou com Lei nº 10.639/03 um excelente instrumento de concretude para o resgate e aprendizado real da história do país. Com essa lei, História e Geografia, por exemplo, disciplinas com as quais se lida separadamente com as noções de tempo e espaço, deixam de ser um mero compartimento de saber formal e se fundem num registro existencial do povo brasileiro, permitindo que a História do Brasil se distancie do “era uma vez” e adquira um sentido menos fantasioso e mais fantasticamente realista.
Vislumbra-se com isso uma mudança de olhares, de práticas institucionais a partir de vivências pedagógicas relacionadas aos contingentes populacionais da base étnica de formação da sociedade brasileira, e que foram expulsos da base intelectual necessária para engendrar o conhecimento que essa sociedade pode ter de si mesma. A despeito de todos os estudos já produzidos no país demonstrarem que negros e indígenas são elementos formadores do povo brasileiro, além dos descendentes europeus, em especial dos portugueses, o fato é que no ensino da História do Brasil, negros e indígenas nunca ocuparam lugar de destaque, diluindo-se na narrativa triunfal do conquistador. Construímos, assim, uma pirâmide social e uma História sobre ela que se pretende tão imutável quanto as pirâmides egípcias. Porém, a nossa pirâmide é feita de gente e gente age em dialética, ninguém é de pedra!
O texto não representa necessariamente a opinião do Coletivo Transforma MP.
[2] Vale lembrar da Lei nº11.645/08. sobre o ensino da cultura indígena também dá um salto de qualidade no estudo da História do Brasil.
Maria Betânia Silva – Procuradora de Justiça Aposentada – MPPE e membra do Coletivo Transforma – MP