Na última sexta-feira, 5, a defensora pública Fernanda Nunes Morais relatou ter sido vítima de constrangimento e de machismo em meio a uma sessão do Tribunal do Júri no fórum de Feira de Santana/BA. A defensora conta que em sessão realizada um dia antes o promotor de Justiça pediu que ela se acalmasse durante os debates em plenário, dizendo que “a primeira vez com um negão não dói”.
Era a primeira vez em que a defensora atuava em um caso com o promotor Ariomar José Figueiredo da Silva, que costuma atuar em julgamentos de crimes no interior do Estado. Em sua conta no Twitter, a defensora se posicionou dizendo: “Eu não vou admitir esse tipo de situação. Eu estava no exercício das minhas funções. Isso precisa acabar!”.
Diante do episódio, a Coletiva de Defensoras Públicas do Brasil emitiu Nota Pública em que reafirma o “compromisso no enfrentamento intransigente de toda forma de violência praticada contra mulheres no país” e classifica a situação como “repugnante e inaceitável”.
A integrante do Transforma MP, promotora de Justiça do MPMG, Daniela Campos de Abreu Serra, uma das autoras de estudo que buscou dar visibilidade ao problema do machismo no Ministério Público, comentou o episódio registrado em Feira de Santana. Na opinião dela, há uma mudança em relação ao passado recente no que diz respeito à reação das vítimas de ofensa por motivo de gênero em contexto institucional. “Episódios como esse, ou o que aconteceu com uma colega do Paraná recentemente, dentre tantos que poderíamos identificar, sempre foram cotidianos. A diferença é que agora as mulheres passam a dar visibilidade ao fato e dizem que não se sentem confortáveis com esse tipo de conduta no ambiente profissional e que querem ser respeitadas”, constata.
Daniela Campos de Abreu Serra ainda ressalta que o problema não se encerra com uma possível penalização imposta pelo Ministério Público. “Muito além de punição, importante a compreensão de que é reprovável a naturalização de condutas misóginas, sexistas e ofensivas de qualquer natureza. O MP tem a obrigação de trabalhar em prol da construção da sociedade solidária. Por isso tem que reconhecer o problema e agir para superá-lo”, avalia.
A Nota:
Debate gerado pela publicação da tese
Na tese “Diagnóstico e perspectivas da desigualdade de gênero nos espaços de poder do Ministério Público: “santo de casa não faz milagre”?, apresentada no XXII Congresso Nacional do Ministério Público, Daniela e outras cinco colegas de Ministério Público apontam que a própria falta de dados básicos para a realização da pesquisa, como número de mulheres ocupantes de cargos de poder na instituição, revela o tamanho do problema a ser enfrentado. “Primeiro, ficamos impressionadas por não existirem números separados entre homens e mulheres. O primeiro passo para enfrentar o desafio é tornar essa questão da falta de dados visível”, afirma Daniela.
Além de Daniela Campos Abreu Serra, assinam a tese Mônica Louise de Azevedo (MPPR), Maria Clara Costa Pinheiro de Azevedo (MPMG) e Hosana Regina Andrade de Freitas (MPMG), também do Transforma MP, Maria Carolina Silveira Beraldo (MPMG) e Ana Teresa Silva de Freitas (MPMA).
Posteriormente, o Conselho Nacional do Ministério Público, presidido pela Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, realizou a pesquisa Cenários de Gênero e as Conferências Regionais das Procuradoras e Promotoras, cujo documento final está em fase de elaboração.
No entanto, ainda há muito a ser feito para que episódios de machismo institucional não sejam mais comuns no sistema de justiça brasileiro.
Com informações do site Migalhas
Foto: Paula Moraes | Mídia NINJA | Coletivo Difusão, Marcha das Mulheres em Manaus.