A democracia corre sério risco. O ordenamento jurídico está em perigo. Os direitos fundamentais, a duras penas conquistados e consagrados, parecem não mais valer. O Estado de direito precisa ser defendido e precisa se impor. Neste momento, são essenciais mulheres e homens capazes de tomar decisões históricas. Capazes de posicionar-se contra a maré intolerante e truculenta que se apresenta. De posicionar-se a favor dos princípios fundamentais da República.
Está no artigo 10 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo 14 (1) do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e no artigo 8 (1) da Convenção Americana de Direitos Humanos. Ser julgado por juízes e tribunais independentes, imparciais, sem interesse no deslinde do feito e absolutamente isentos é direito fundamental e inalienável de todo e qualquer ser humano.
Pela nossa Constituição, não se pode excluir do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV). Não pode haver, sob nenhuma hipótese, juízo ou tribunal de exceção (art. 5º, XXXVIII). Ninguém pode, ademais, ser processado nem julgado senão pela autoridade competente (art. 5º, LIII). Cabe ao Supremo Tribunal Federal a guarda da Constituição (art. 102) e, consequentemente, dos direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro (art. 5º, § 2º).
Nos últimos dias, vieram à tona demonstrações claras da violação das mais básicas regras que regem o devido processo legal. Conluios, acertos prévios, quebra da imparcialidade, conspirações feitas à margem do sistema normativo mostraram o quão manipulado pode ser o funcionamento da justiça – que deveria ter como características principais a imparcialidade, a equidistância das partes e a inércia. Mas o que se viu foi exatamente o contrário: um integrante do Poder Judiciário participando das investigações, da coleta da prova, da instrução processual e até de decisões sobre o direito de recurso.
Não se pode tergiversar com direitos fundamentais. A quebra da institucionalidade poderá trazer consequências imprevisíveis. Todas as demais instâncias do Poder Judiciário e do Ministério Público sentir-se-ão autorizadas a agir da mesma forma. A violação frontal dos princípios que regem o processo legal – por aqueles que deveriam ser seus garantes – se não for reconhecida como ilegal e condenável, gerará insegurança jurídica para toda a população, notadamente em sua parcela mais vulnerável.
Assim, necessário que o Supremo Tribunal Federal tenha a segurança e o apoio necessários para restaurar a normalidade democrática, permitindo-se que sejam retomadas as investigações, de forma técnica, politicamente neutra e obediente às garantias constitucionais, e que, se o caso, após o devido processo legal, sejam aplicadas as penas eventualmente cabíveis aos envolvidos. Será a demonstração da grandeza e da responsabilidade social e histórica que a Constituição Federal de todos nós espera.
Coletivo por um Ministério Público Transformador