Por Leomar Daroncho no Correio Braziliense
Abril é mês do alerta para os acidentes e as doenças do trabalho em razão de duas datas: 7/4 — Dia Mundial da Saúde, e 28/4 — Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes de Trabalho. O laço verde da campanha Abril Verde identifica a segurança e a saúde no trabalho. Depois de abril, vem o feriado de 1º de maio — Dia do Trabalho — criado pelo residente Arthur Bernardes, em 1924, dedicado “à confraternidade universal das classes operárias e à comemoração dos mártires do trabalho”.
Em 1988, os direitos trabalhistas ganharam destaque no texto constitucional. O Brasil teria a terceira maior Constituição do mundo, com mais de 250 artigos e 70 mil palavras. Todavia, emprega apenas uma vez a palavra “primado”, termo que remete à ideia de primazia, prioridade ou supremacia. Foi usada para qualificar a relevância do trabalho na base da ordem social, que tem como objetivo o bem-estar e a justiça social (art. 193).
Assim, a categoria do trabalho pretendida pela Constituição não pode se dar em ocupações precárias. Exige que o trabalho seja digno, com direitos básicos garantidos, como forma de assegurar a justiça social e a prosperidade, pressupostos inclusive do desenvolvimento do mercado interno, vital para sustentação das atividades econômicas.
Com esse enfoque, Brasília sediou, em 19 e 20 de abril, o Seminário Trabalho Digno em Frigoríficos — Comemoração aos 10 anos da NR 36. Celebrou-se a norma que estabelece as condições mínimas de segurança e saúde no setor que emprega 590 mil brasileiros e ainda é marcado por graves índices de acidentes e doenças ocupacionais.
Análise recente de informações do INSS (https://smartlabbr.org/) indica que a pecuária e o trabalho rural concentram as ocupações mais perigosas. Nos frigoríficos, são 90 acidentes por dia. Em 2021, 40 trabalhadores de frigoríficos morreram no trabalho. Os números reais são piores, pelo menos 300% superiores aos registros oficiais, conforme reconhece o Ministério do Trabalho. A subnotificação é alarmante quanto aos acidentes.
No evento, promovido pelo Ministério Público do Trabalho, Escola Superior do Ministério Público da União e Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho, interagiram mais de 450 participantes presenciais, além de 1.300 que acompanharam a programação em tempo real pela internet.
Ao final, entidades sindicais — Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação, Confederação Brasileira Democrática dos Trabalhadores da Alimentação e União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação — leram a Carta de Brasília, celebrando o marco civilizatório representado pela norma que entrou em vigor em 2013.
O documento condena as temerárias tentativas de “adequações” ou “harmonizações”, destacando a luta travada contra as recentes investidas que buscaram destruir a norma: a NR 36 “continua salva e salvando vidas”. Apresentaram uma pauta com itens para a melhoria das condições de trabalho no setor, tais como a recomposição do quadro de auditores fiscais e o incremento da fiscalização; a redução das jornadas extenuantes, em atividade reconhecidamente penosa, e a adequação do ritmo de trabalho; a adoção de medidas especiais de proteção às mulheres e gestantes, deficientes, povos indígenas e migrantes; e o clamor para que a NR36 seja símbolo de organização, mobilização e luta por um ambiente de trabalho digno, saudável, humano e justo, alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (Agenda 2030). Por fim, salientaram que a norma concretiza compromissos com os direitos humanos embora ainda haja muito a ser conquistado.
O Dia do Trabalho exige reflexão acerca do alinhamento do Brasil aos valores e princípios básicos da OIT e do compromisso com a pauta civilizatória. O trabalho, que gera riquezas, deve ser fonte de dignidade, pois, conforme assinala a OIT, a pobreza é ameaça à prosperidade, sendo que todos têm o direito de perseguir o bem-estar material em condições de liberdade e dignidade.
O presidente do Comitê do Prêmio Nobel, ao fazer a entrega do Prêmio Nobel da Paz à OIT em 1969, destacou que “a OIT tem uma influência perpétua sobre a legislação de todos os países”, devendo ser considerada “a consciência social da humanidade”. Que o Dia do Trabalho represente a celebração da luta pelo trabalho digno.