Nota contra ordem de despejo do Centro de Formação Paulo Freire, localizado no Assentamento Normandia, em Caruaru

Incra (que deveria ser o primeiro a defender) tenta acabar com assentamento que abriga o Centro de Capacitação Paulo Freire, em Caruaru

“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”.

Paulo Freire

O Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) obteve a autorização para a reintegração de posse de área onde está localizado o assentamento Normandia, na zona rural de Caruaru (PE). Gerida pela Associação Comunitária do Centro de Capacitação Paulo Freire, a área abriga a ‘Academia das Cidades’, além de uma quadra poliesportiva, creche, centro de beneficiamento de alimentos e três agroindústrias, pertencentes à cooperativa agropecuária de Normandia e ao Centro de Formação Paulo Freire, responsável pela capacitação de assentados da reforma agrária em todo o Estado.

Diante disso, o Coletivo por um Ministério Público Transformador, Transforma MP, divulga Nota Pública em solidariedade à luta dos trabalhadores rurais de Pernambuco  na defesa da manutenção do Centro de Formação Paulo Freire.

Na situação atual, a entrega do espaço ao Incra representará o desmantelamento de um centro de formação popular, administrado pelos trabalhadores rurais, e que em parceria com os governos municipal, estadual e federal, e com instituições de ensino nacionais e internacionais, vem desenvolvendo ações contínuas na formação dos trabalhadores do campo, com ênfase na capacitação para o manejo de sistemas agroflorestais e na formação cidadã dos assentados.

As atividades são realizadas mediante convênios com universidades e escolas técnicas, a exemplo da UFPE, UFRPE, UPE, IFPE, Fiocruz, além de órgãos estaduais de extensão como o Instituto Agronômico de Pernambuco.

O local também tem funcionado como alojamento e centro de formação para inúmeras turmas de trabalhadores rurais, indígenas e de outros grupos de movimentos populares, que lá participam de atividades no campus Agreste da Universidade Federal de Pernambuco.

Ao pedir a reintegração de posse, o Incra ignora os assentados e a história de luta pela reforma agrária, que o próprio Instituto leva no nome, para atender a interesses de latifundiários lobistas de empresas de agrotóxicos.

Jaime Amorim, coordenador regional do MST em Pernambuco, explica que o espaço foi erguido de acordo com as recomendações do poder público. “Tudo o que nós construímos aqui está dentro da legalidade. Nós fomos construindo o Centro de Formação a partir das informações do próprio Incra”, destaca. Veja no vídeo:

 

Leia a Nota na íntegra:

O COLETIVO POR UM MINISTÉRIO PÚBLICO TRANSFORMADOR – TRANSFORMA MP, entidade associativa formada por membros do Ministério Público brasileiro (da União e dos Estados), sem fins lucrativos ou corporativos, na defesa intransigente da CONSTITUIÇÃO e do REGIME DEMOCRÁTICO, e nos termos dos itens M.2, M.4, M.7, M.8 e M.9 de sua Carta de Princípios, vem, diante da manifestação recente do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA (INCRA), órgão cuja vocação inicial é a mediação e o desenvolvimento de políticas públicas para a realização do direito ao acesso à terra aos camponeses e o fortalecimento das suas atividades, especialmente no âmbito da agricultura familiar ou cooperativa, visando a minorar as desigualdades historicamente oriundas da concentração de terras e riquezas nas mãos de poucos latifúndios, no Brasil, em detrimento de uma massa de excluídos, muitas vezes submetidos a situações de exploração no uso de sua mão de obra em condições indignas de trabalho, manifestar APOIO E SOLIDARIEDADE ao CENTRO DE FORMAÇÃO PAULO FREIRE, localizado no Assentamento Normandia, na cidade de Caruaru, Pernambuco, que se vê sob a égide de uma ORDEM DE DESPEJO, em um pedido de REINTEGRAÇÃO DE POSSE promovido pelo INCRA, em detrimento da efetiva vocação deste importante órgão da estrutura da União na busca pela efetivação de justiça social no país.

Registre-se que a gestão do Centro de Formação Paulo Freire se dá por meio da ASSOCIAÇÃO CENTRO DE CAPACITAÇÃO PAULO FREIRE, que representa o esforço coletivo dos assentados, trabalhadores rurais sem terra, em promover, na área comum do assentamento, atividades de capacitação dos assentados e de toda comunidade local, tendo como foco o desenvolvimento de técnicas de manejo sustentável e a formação cidadã dos homens e mulheres do campo, daquela região.

Originalmente instalado em 1999, o Centro de Formação Paulo Freire vem desenvolvendo, nestes últimos vinte anos, por meio da sua Associação e o MOVIMENTO DE TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA – MST, trabalho de extraordinário valor social para a comunidade de assentados e Iualdo para camponeses, indígenas e outros movimentos populares da região e do estado, que tem no Centro de Formação o espaço indispensável para realização de capacitações e atividades, inclusive em parceria com a União, com o Estado de Pernambuco, os Municípios circunvizinhos, para além de Universidades locais e Estrangeiras, as quais têm compreendido o papel de grande relevância desenvolvido pelo Centro, na garantia do direito fundamental à educação.

Na situação atual, a entrega do espaço ao INCRA representará o desmantelamento de um centro de formação popular, administrado pelos próprios trabalhadores rurais e a suspensão, com prejuízos incalculáveis, de todas as atividades educacionais em desenvolvimento, o que representa retrocesso inaceitável no âmbito dos direitos e garantias fundamentais do acesso ao conhecimento, capacitação e formação, previstos como garantias inafastáveis no âmbito de nossa Constituição, para todos.

A adoção de medidas que fragilizam estruturas de formação e educação popular, voltadas para as parcelas notadamente excluídas no processo de acesso e distribuição de riquezas, neste particular momento histórico, representa ação inaceitável e se soma a outros processos de desmonte do modelo Constitucional ainda vigente, que tem na justiça social e na solidariedade os seus pilares fundamentais.

Sendo assim, o COLETIVO TRANSFORMA MP vem reafirmar sua crença de que a LUTA POR DIREITOS capitaneada pelos mais diversos MOVIMENTOS SOCIAIS se apresenta como ação fundante de uma SOCIEDADE EFETIVAMENTE DEMOCRÁTICA E LIVRE, razão pela qual presta toda SOLIDARIEDADE ao MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA – MST, ao CENTRO DE FORMAÇÃO PAULO FREIRE, bem como a todos os trabalhadores rurais do ASSENTAMENTO NORMANDIA, em Caruaru- PE, no exercício da legítima defesa do patrimônio cultural construído por meio de duas décadas de atividades lastreadas em práticas libertadoras de educação, inspiradas nos ensinamentos do patrono do centro, Paulo Freire, e promovidas pelos homens e mulheres que enxergaram na luta coletiva pela terra e pela emancipação, por meio do conhecimento, o caminho justo para uma outra convivência mais fraterna e solidária, também no campo.

Brasília, 10 de Setembro de 2019
COLETIVO POR UM MINISTÉRIO PÚBLICO TRANSFORMADOR –
TRANSFORMA MP

 

 

 

 

 

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